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Hiram Reis e Silva

A Terceira Margem – Parte CLIV - Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XXX - Vingaram as Sementes da Desídia e da Discórdia


A Terceira Margem – Parte CLIV - Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XXX - Vingaram as Sementes da Desídia e da Discórdia - Gente de Opinião

Bagé, 17.02.2021

 

Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte XXX

 

A Terceira Margem! II

 

Vingaram as Sementes da Desídia e da Discórdia

 

Bárbaros, vós que o prendestes no cárcere maldito do desespero, cujas brônzeas grades ele quebrou com o arremesso de suas asas possantes de águia, iluminada e altiva, vós que o feristes com as mil setas ervadas da injúria e da calúnia; vós que o trouxestes arrastado pelo marnel ([1]) do mundo, sem que ele conspurcasse no pantanal as, suas asas célicas, feitas de azul e feitas de perdão, vindo ver esta apoteose, esta festa que resume o talento e a força sublimada da grandeza de um coração. Vós que fizestes a sua alma sangrar, não fel de ódio, que a alma de um artista é bastante generosa para o não possuir, bem clemente para o não guardar, mas o desconforto, que aumenta essa tristeza ingênita que nós trazemos para
o mundo adverso e mau. (O PAIZ, N° 5.647)

 

Quando telefonei para o Gen José Luiz Jaborandy Júnior, este me informou, bastante constrangido, que a imperativa ordem partira do Gen Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, Comandante do CMA.

 

Apelei, então, para o Gen Paiva, Comandante do 2° Gpt E (meu ex-Cadete), que disse não estar autorizado, pelo Cmt do CMA, a providenciar o transporte das embarcações de Porto Velho (RO) para Cruzeiro do Sul (AC).

 

Depois de relatar os fatos em artigo, publicado pela imprensa nacional e o encaminhado a vários amigos, decidi, encarar o desafio sozinho, não tinha recursos para custear as despesas com a voadeira, o Mário e o Marçal, considerando as dificuldades adicionais proporcionadas pela falta de apoio por parte do CMA.

 

Sina de um Bandeirante

 

Veio-me imediatamente à mente a figura do Coronel Flaviano de Mattos Vanique, líder da Expedição Roncador-Xingu. Façamos uma breve digressão histórica que culmina com a homenagem prestada em São Paulo aos bravos expedicionários. Em 1937, na cidade de Genebra, o Barão Shudo, representante do Japão, sugeriu no plenário da Sociedade das Nações (embrião da ONU), que as nações que dispusessem de áreas inexploradas e sem desfrutar de seus recursos naturais, deveriam permitir seu aproveitamento racional por países capazes de explorá-las “para o bem comum dos povos”. O Governo japonês tinha intenção de alojar vinte milhões de japoneses na Amazônia Brasileira. Com a ascensão do nazi-fascismo ganhou corpo a doutrina do “espaço vital”.

 

O Brasil era um dos alvos dessa doutrina, pois, na época, mais de 90% da nossa população se achava distribuída por pouco mais de um terço de nosso território. Em pleno século XX, grande parte do território nacional era praticamente despovoado e desconhecido pela maioria dos brasileiros. Com o advento II Guerra Mundial e o torpedeamento de navios brasileiros ao longo de nossa costa a Capital Federal mostrava-se extremamente vulnerável a um ataque inimigo.

 

O Presidente Getúlio Vargas, preocupado com o grande vazio demográfico das regiões Norte e Centro-Oeste cobiçadas por países estrangeiros para assenta­mento de seus excedentes populacionais e a vulnera­bilidade de nossa Capital, criou, em Setembro de 1942, a Comissão da Coordenação da Mobilização Econômica cujo primeiro coordenador foi o Ministro João Alberto Lins de Barros. A Comissão além de adotar práticas econômicas excepcionais no contexto emergencial gerado pela entrada do Brasil na guerra, era encarregada de estimular o desbravamento e povoamento das regiões desabitadas.

 

Correio Paulistano, n° 26.814

São Paulo, SP, Domingo, 08.08.1943

Benção do Pavilhão Nacional que Seguirá na Expedição Roncador-Xingu

Oração do Dr. Gofredo Teixeira da Silva Telles

 

Após a missa solene celebrada no altar mor da Basílica, foi iniciada a cerimônia junto ao túmulo de Fernão Dias Pais leme onde se encontrava o Pavilhão brasileiro que damas da nossa melhor sociedade ofereciam ao Ten Cel Matos Vanique para levar junto à Expedição que a exemplo das antigas Bandeiras paulistas seguirá para a região do Roncador-Xingu. O pavilhão foi benzido por D. Domingos de Silos, findo o que fez uso da palavra o Dr. Gofredo da Silva Telles ([2]), Presidente do Conselho Administrativo, que disse o seguinte:

 

O Pavilhão que aqui tendes, senhores Bandeirantes, é um presentes das senhoras de São Paulo, feito por suas mãos e entregue por suas mãos. Essa dádiva que tem o caráter de uma oferenda votiva, nasce do ardor com que a paulistana acompanha sempre os grandes empreendimentos dos filhos de nossa terra. Elas souberam de vossas intenções. Tiveram notícias de vossos propósitos, de vossos sonhos, de vossos preparativos. A viagem, sertão a dentro!

 

Inteiradas do plano audacioso, alegraram-se com a descrição de vossos roteiros temerários. E, longe de chorar, ante o quadro da campanha projetada, tiverem orgulho de vós. As perspectivas desdobram-se em seu espírito alongando os olhos para os extremos do sertão brasileiro, elas perscrutam, em pensamento, as solidões indevassadas, cujos mistérios vão ser desafiados por vossa coragem.

 

E por tudo isso, em vez de chorar, orgulham-se da vós. Não se iludem as nobres doadores desta Bandeira sobre o que serão as asperezas da jornada. Pensaram na mata inextricável, nos cerradões adustos, nas paludes traiçoeiras. E em vez de chorar, vendo-vos parti, orgulham-se de vós.

 

Acompanhando-vos, em sua imaginação realista, avistam, de longe, vossos pequenos grupos de pioneiros, a salpicar o chão virgem do deserto. Medem as distâncias a percorrer, contam os marcos da caminhada. Elevadas, contemplam vosso avanço contra as barreiras naturais e contra as intempéries.

 

O avanço que, apesar dos obstáculos, não se interrompe; o avanço que continua para as metas visadas, desde o primeiro momento e das quais não vos sabereis desviar! Por tudo isso, em vez de chorar, as senhoras de São Paulo orgulham-se de vós.

 

Elas compreenderam vossa empresa, senhores Bandeirantes, e confiam no triunfo de vosso esforço. Confiam nele porque sentem viver em si próprias a mesma fibra que vos impele – obedientes, tanto como vós, ao imperativo atávico, fieis, tanto como vós, à vocação de uma raça que nasceu para avançar. Pensai um pouco no que é ser Bandeirantes. Fácil sem dúvida, nesta igreja tradicional de São Paulo, à beira do túmulo ancestral de Fernão Dias Pais Leme, apreender a significação profunda desta palavra.

 

Ser Bandeirante é ser forte e partir. É ser simples e confiar em si. Ser Bandeirante é olhar para o sertão que ninguém penetrou e dizer: “Este é o meu sertão!” É estender a mão de dono sobre as coisas que parecem fora de alcance, além do poder humano. É preferir o perigo ao lucro. É ser desambicioso, e, ao mesmo tempo, incontestado; modesto e insaciável. É querer avançar, pelo gosto de – mais longe. É gritar: "além", depois de ter chegado ao fim. Ser Bandeirante é deixar atrás a casa e família, o bem estar e a segurança, para perseguir o sonho e tentar a caça da glória. É viver silencioso e otimista na brenha onde não há rumos, no campo onde não há divisas. É estremecer as vezes de febre, mas nunca tremer de medo. É sofrer com alegria o Sol dos chapadões e resistir sem queixa nos aguaceiros de dezembro. É combater no varejão as cachoeiras e investir, de simples facão à cinta, contra a floresta. Ser Bandeirante, é gastar em busca de Itaberabessú, vinte anos de marcha na mata, nos brejais, nas savanas. É procurar Palma e sonhar com Manos sabendo que elas não existem. Ser Bandeirante é ser aquele que avança e aquele que conquista. Ser Bandeirante é ser o primeiro... e o que vai mais longe. Para dizê-lo numa só palavra, senhores sertanistas de São Paulo e de todo os Estados do Brasil, basta a afirmação de que ser Bandeirante é ser a nossa raça.

 

Eis ai o que sabem e sentem as doadoras deste estandarte. Elas aqui o deixam em vossas mãos, Bandeirantes do dia presente, filhos de São Paulo e de todos os recantos de nossa Pátria, como um penhor de sua aprovação a vosso sentimento. Recebido por vós ante o altar de Deus, será o pavilhão brasileiro durante toda a vossa jornada, o arrimo de vossa fé cristã e o símbolo de vosso ideal patriótico.

 

As bênçãos que o cobriram hoje nesta igreja derramar-se-ão também sobre vossos passos, para que o possais levantar festivamente em cada pausa de vossa caminhada, como a prova cotidiana de vossos triunfos. Levantai-o seguidamente, sobre os campos e as matas de nossa terra. Levantai-o nos sertões de Araguaia, do Rio de Mortes e do Xingu. E ao termo vitorioso da jornadas, levantai-o sobretudo nos cimos lendários da Serra do Roncador para onde se dirigem vossa esperanças de pioneiros. Suba ali o pavilhão brasileiro para que o Vento do deserto desdobre seu pálio auriverde, sobre os nossos domínios de nossa raça. Içada por vossas mãos desfralde-se a bandeira nacional em pleno dia no topo da cordilheira, alçai-a mais e mais, tanto quanto puderdes. O simbolismo da bandeira erguida no clarão radioso das alturas, dar-vos-á para sempre, senhores Bandeirantes, o sentido de vossa obra em favor de nossa Pátria”. (CP, n° 26.814)

 

Bibliografia

 

CP, N° 26.814. Benção do Pavilhão Nacional que Seguirá na Expedição Roncador-Xingu – Brasil – São Paulo, SP – Correio Paulistano, n° 26.814, 08.08.1943.

 

O PAIZ, N° 5.647. Um Artista – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – O Paiz, n° 5.647, 24.03.1900.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

·     Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

·     Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

·     Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

·     Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

·     Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

·     Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

·     Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

·     Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

·     Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

·     Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

·     Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

·     Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

·     Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

·     E-mail: [email protected].



[1]   Marnel: lodaçal.

[2]   Vereador e, mais tarde, prefeito da cidade de São Paulo (24.05.1932 a 03.10.1932), nasceu no Rio de Janeiro, em 17.04.1888, e faleceu em São Paulo, no dia 30.07.1980.

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