Domingo, 31 de agosto de 2025 - 08h15
Nas
conversas que tenho mantido com empresários e, principalmente, com professores
universitários de Direito e Economia, há um consenso de que o presidente Lula
perdeu as condições de negociar o "tarifaço" com o presidente Trump,
como fizeram outros países.
A
essa altura, parece que o melhor caminho é a sociedade brasileira encontrar uma
solução, pois o presidente Lula acredita estar crescendo politicamente por
“defender a soberania brasileira”. Ora, no caso do Brasil, soluções para
reduzir os efeitos negativos do "tarifaço" devem ser negociadas,
segmento por segmento, com empresários americanos que têm acesso à Casa Branca.
Essa
ação se faz necessária, já que a política do governo de “dobrar a aposta” de
forma permanente está trazendo sérios problemas para todos.
Em
outras palavras, o povo, a sociedade, empresas, economistas e professores
universitários precisam abrir um caminho fora da esfera do poder público para
conseguir mitigar os efeitos negativos sobre a economia brasileira. É preciso
defender o bem-estar do povo, os empregos, combater a inflação e permitir o
desenvolvimento.
A
impressão que tenho é de que, desse modo, algo será conquistado. Há setores que
estão melhorando. Percebe-se que a indústria de carne e café são capazes de
conseguir redução das tarifas. Outras empresas e setores já conseguiram o
mesmo, o que serve de precedente. Além disso, a redução de tarifas também afeta
a economia americana, o que pode facilitar um acordo.
É
certo que a estratégia do presidente Trump de criar uma tarifa para depois
acordar sua diminuição pode ter provocado negociações com todos os países. A
ideia não era punir as outras nações, mas sim obrigá-las a reduzir suas
tarifas.
No
nosso caso, porém, a intenção pareceu ser a de punir. Temos uma das mais altas
tarifas alfandegárias do mundo, superando inclusive a Índia. Em última análise,
o Brasil é uma nação que impõe muitos tributos, mas não quer que os mesmos lhe
sejam impostos.
A
solução deve, portanto, vir do setor privado, do povo e da sociedade. Isso
porque o governo perdeu as condições de diálogo com a sua política de
"dobrar a aposta".
Estou
convencido de que, apesar do momento complicado que enfrentamos, teremos que
manter os juros em um patamar elevadíssimo; em 10% ao ano, em termos reais. E
temos esse juro real elevado porque não se confia que o Brasil, com o
endividamento que segue crescendo no governo do presidente Lula, terá condições
de pagar a dívida. Juro real é o ganho que, de fato, se obtém sobre a aplicação
do dinheiro.
Embora
a dívida brasileira ainda seja inferior a dos Estados Unidos, a economia deles
é a mais forte do mundo. No entanto, a dívida do Brasil é, talvez, a maior
entre os países em desenvolvimento.
Ora,
se eu tenho dinheiro e não confio em um país, só vou arriscar meu capital se
houver juros elevados. Ao dar juros altos, o país amplia a atração de
investimentos. Por isso, os juros reais de 10% no nível do sistema financeiro
são elevadíssimos, até porque o Brasil, em vez de ser um país de investimento,
é um país de especulação.
Os
países são divididos em investidores e especulativos. Nós, por exemplo, estamos
em terceiro grau em nível especulativo. As pessoas percebem que a má
administração da política econômica prejudica o povo, a nação, o
desenvolvimento e o crescimento.
O
presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, está realizando uma política
econômica de certo modo adequada. Ele é o verdadeiro responsável por segurar a
inflação, enquanto o presidente Lula aumenta a pressão sobre ela.
Por
isso, me parece fundamental que os setores privados, com acesso a empresários
estadunidenses, que tenham trânsito na Casa Branca, trabalhem intensamente,
setor por setor, conforme a necessidade de cada um, para conseguir a redução de
tarifas, o que algumas empresas já obtiveram e que outras estão em vias de
conseguir. Isso seria bom para o Brasil e aliviaria um pouco a situação.
Não
tenho esperança de que o governo Lula mude de atitude, pois parece que ele
ganhou alguma aprovação ao “defender a soberania nacional” contra os Estados
Unidos, além da divulgação da narrativa dos "pobres contra os ricos"
e de que os ricos devem ser punidos pelos pobres.
Fato
é que todos os países que negociaram, conseguiram baixar as tarifas aplicadas
pelos Estados Unidos. O Brasil é o único que não consegue negociar, pois o
discurso político está influenciando diretamente o discurso econômico.
Ives
Gandra da Silva Martins é
professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O
Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme),
Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª
Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin
de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das
Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da
Universidade do Minho (Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da
Fecomercio -SP, ex-presidente da Acade mia Paulista de Letras (APL) e do
Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).