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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

SÃO PAULO – a Pauliceia desvairada

Uma civilização burguesa ou pós-burguesa


SÃO PAULO – a Pauliceia desvairada - Gente de Opinião

Vinício Carrilho Martinez

Professor Associado IV da UFSCar

 

Gabriel Longatto Clemente

Doutorando em Matemática – PPGM/UFSCar


A cidade de São Paulo, capital paulista, a gigante brasileira, a capital de um país dentro de outro país, tem uma história secular, feita por gente múltipla, pessoas vindas do Brasil todo e do mundo todo: é a Pauliceia que nunca para, habilmente frenética, com economia e cultura em cada esquina e a todo tempo.

São Paulo não para, não fecha, não tem e não dá descanso: é a própria civilização que constrói como selva de pedra, poluição, trabalho, grandeza, contradições, miséria absoluta, abandono, indiferença e esquecimento. São Paulo é uma cidade que personifica a ambivalência da vida urbana.

Ao longo dos anos, São Paulo se tornou um caldeirão de experiências contraditórias que, por vezes, deixam seus habitantes perplexos, mas, quase sempre, deixam seus visitantes interioranos ainda mais perplexos.

Diz-se, faz muitos anos, que o teste para quem chega na cidade pela primeira vez – especialmente em alguma de suas rodoviárias – é atravessar a Avenida Paulista em horário de pico. Se bem que, São Paulo só tem horário de pico no trânsito alucinado – até mesmo nos maiores bairros populares.           

Por um lado, a cidade é um oásis cultural. O Museu de Arte de São Paulo (MASP) e o Museu de Arte Moderna (MAM) são ícones da alta cultura, abrigando obras de renome mundial como Degas, Portinari, Renoir, Van Gogh, et reliqua. O Catavento Cultural é um espaço fascinante, repleto de exposições interativas que estimulam a mente.

A riqueza cultural da cidade se estende a teatros, cinemas, livrarias e uma cena musical efervescente que atrai artistas de todo o mundo. São Paulo hospeda a Universidade de São Paulo (USP), como a melhor universidade da América Latina. São Paulo tem incontáveis universidades, especialmente as públicas, centros de pesquisa, institutos federais, tem o Butantã, as vacinas que nos salvaram em 2020.

Porém, a par dessa riqueza cultural, vemos a ostentação financeira que permeia a Avenida Faria Lima, onde carros de luxo deslumbrantes desfilam pelas ruas. Os arranha-céus reluzentes testemunham o poder econômico desmedido, tendo os bairros nobres uma qualidade de vida invejável. A mera especulação no mercado financeiro, improdutiva de riqueza de fato – sem “chão de fábrica” –, é a fonte dessa ilusão e depreciação do conjunto da vida humana.

Afinal, essa prosperidade não é compartilhada por todos. Existe uma realidade chocante e desoladora: a pobreza extrema é uma ferida aberta que São Paulo tenta cicatrizar, muitas vezes, através de políticas populistas que visam agradar às classes médias e à pequena burguesia.

Os moradores de rua, muitos deles em situações deploráveis, são uma presença constante, como seres já dessocializados, esquecidos do próprio nome e da identidade. A Cracolândia é um ponto alto deste cenário que se mistura entre os filmes Mad Max (Walking Dead) com Zumbilândia. É um ponto crítico fora da curva na ideia de cidade, civilidade. Nossa Zumbilândia é um testemunho gritante da batalha perdida contra as drogas e a marginalização social.

Nisso tudo, o mais desconcertante: a indiferença organizada (orgânica) para ser desumanizadora. Por exemplo, um morador de rua pede uma esmola simplesmente pelo fato de ter tido contato visual com você, enquanto um motorista de aplicativo, ao passar por um nicho da Cracolândia, refere-se aos seus habitantes como "ratos".

Essa falta de empatia reflete a distância que separa as diferentes camadas da sociedade paulistana. Enquanto alguns desfrutam do luxo e da cultura, outros lutam pela sobrevivência nas ruas, lutando contra os ratos que o Poder Público estimula com sua inegável inação.

A pressa é uma constante na vida dos paulistanos, exacerbada pelo trânsito caótico que congestiona as vias. O som constante de buzinas, motores, sirenes, aviões e viaturas cria uma poluição sonora quase insuportável, que contrasta com a serenidade que a cultura proporciona.

Em São Paulo, as contradições são parte integrante da experiência urbana. É uma cidade onde a opulência e a miséria, a cultura e o abandono, a pressa e o caos, coexistem de maneira complexa e, por vezes, angustiante. É uma cidade onde a vida pulsa com intensidade, mas onde as diferenças sociais e os desafios urbanos são um lembrete constante de que, apesar de todo o brilho, a desigualdade persiste como uma sombra sobre a cidade.

Esse conjunto ilustra o Brasil mix, flexível e flexionado, mescla do atraso renitente com um futuro ausente. Temos complacência com a vilania. Não somos híbridos; temos sim ideologia flex.

São Paulo resume o Brasil.

* Infelizmente, a capital paulista não tem praia – ao contrário do que pensam o atual governador e o secretário de educação.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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