Terça-feira, 23 de abril de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Política - Nacional

O Brasil de Dilma: mãos à obra


 
O Brasil vive sob o descompasso existente entre os avanços econômicos e culturais alcançados nos últimos oito anos e um sistema político arcaico, perpetuador de privilégios. Governos comandados por presidentes populares sempre foram fustigados por essas estruturas arcaicas. Lula não foi exceção e só sobreviveu graças a sua incontestável habilidade política. Daí o seu empenho em, além de eleger a sucessora, dar a ela a possibilidade de governar com um Congresso menos hostil. O Brasil precisa de uma Reforma Política para a nossa democracia avançar. Mas ela não terá efeitos práticos se os meios de comunicação seguirem tendo o absurdo papel político-eleitoral de hoje. O artigo é de Laurindo Leal Filho.

 

Carta Capital - Laurindo Leal Filho

A vitória de Dilma Roussef é um recado da sociedade às forças conservadoras que tentaram, por vários meios, impedir que isso acontecesse. Entre eles destaque-se os meios de comunicação, transformados em partido político, sem base social mas ainda com grande poder persuasivo.

Foram eles os responsáveis pela realização do segundo turno em 2006 e 2010. Sem mandato, julgam-se no direito absoluto de impor à sociedade suas visões de mundo, defendendo interesses restritos à classe social da qual são parte e porta-vozes. Trata-se de uma distorção incompatível com o jogo democrático. O presidente Lula disse, em excelente entrevista à Carta Maior (com Página 12, da Argentina e La Jornada, do México), estar decidido a se empenhar, fora do governo, no trabalho de "primeiro convencer o meu partido de que a reforma política é importante, (...) e depois, convencer os partidos aliados de que a reforma política é importante. Se tivermos maioria, poderemos votar a reforma política, eu diria, nos próximos dois anos".

Tarefa imprescindível, sem dúvida. O Brasil vive sob o descompasso existente entre os avanços econômicos e culturais alcançados nos últimos oito anos e um sistema político arcaico, perpetuador de privilégios. Executivos comandados por presidentes populares, afinados com as aspirações maiores da sociedade, tiveram sempre a fustigá-los interesses mesquinhos articulados por máquinas políticas instaladas no legislativo, mais suscetível ao voto não-ideológico. Situações geradoras de crises históricas que levaram, por exemplo, Getúlio à morte e Jango ao exílio.

Lula não foi exceção e só sobreviveu graças a sua incontestável habilidade política. Daí o seu empenho em, além de eleger a sucessora, dar a ela a possibilidade de governar com um Congresso menos hostil. Talvez essa tenha sido a maior exasperação da mídia ao perceber que muitos dos seus aliados e representantes tradicionais não voltariam, como não voltarão, à Câmara e ao Senado no ano que vem.

No entanto, o país não pode mais ficar à mercê das circunstâncias de ter, como hoje, um presidente disposto a enfrentar nas urnas esses adversários. Para isso são necessárias novas formas, modernas e democráticas, de se fazer política no Brasil. Financiamento público de campanha, equilíbrio nas representações parlamentares estaduais na Câmara e voto em lista, distrital ou misto, são pontos de partida para a discussão proposta pelo presidente Lula.

Mas a reforma não terá efeitos práticos se os meios de comunicação seguirem tendo o absurdo papel político-eleitoral de hoje. Não há democracia que resista por muito tempo ao poder que tem quatro famílias de estabelecer a agenda política nacional. Derrotadas, graças à força de um governo que as superou nas ruas e nas praças, nada garante que não voltem ainda mais dispostas a apoiar - como já fizerem em outras oportunidades - aventuras golpistas.

Não é tarefa fácil. Exige alta dose de competência e muito sangue frio. Qualquer ação corretiva nessa área é chamada de censura por aqueles que defendem seus privilégios com unhas e dentes. Se arvoram senhores da liberdade de expressão, de falarem o que querem, obrigando todos os demais ao mutismo.

Com a força das urnas, o novo governo pode acelerar algumas das iniciativas esboçadas na gestão que se encerra. A mais urgente é darordenação legal ao setor da radiodifusão, verdadeira terra de ninguém, sem lei e sem ordem. O governo Lula deixará para a presidente Dilma o embrião desse projeto calcado nas experiências mais avançadas existentes hoje em todo o mundo e, claro, sintonizadas com a realidade brasileira. Não é possível seguirmos, na era da digitalização e da crescente convergência dos meios, com leis que tratam separadamente as telecomunicações e a radiodifusão. E, esta, além disso datada de 1962, época da chegada do vídeo-tape e da TV em preto e branco.

Quando o mundo convergia suas legislações para adaptar os marcos legais a realidade tecnológica, o Brasil no governo tucano as separava para permitir a privatização das telefônicas e preservar os privilégios dos radiodifusores. Está mais do que na hora de acabar com isso.

Cabe lembrar que já em 2007, o documento final do 3º Congresso Nacional dos Partidos dos Trabalhadores propunha "a imediata revisão dos mecanismos de outorga de canais de rádio e TV, concessões públicas que vêm sendo historicamente tratadas como propriedade absoluta por parte das emissoras de radiodifusão. Esta atualização passa pelo cumprimento da Lei, haja vista a flagrante ilegalidade em diversas emissoras, por maior transparência e agilidade nos processos e pela criação de critérios e mecanismos para que a população possa avaliar e debater não somente a concessão, mas também a renovação de outorgas".

O PT deve se juntar à luta da sociedade organizada para concretizar os preceitos da Constituição Federal de 1988 que estabelecem a proibição do monopólio na mídia e definem como finalidade do conteúdo veicular a educação, a cultura e a arte nacionais.

Que tal começar já, discutindo e aprofundando essas questões no período de transição do governo Lula para o governo Dilma? Passo fundamental nesse sentido é dotar o Ministério das Comunicações de transparência absoluta, aberto à sociedade e aos seus reclamos quanto, por exemplo, a qualidade dos serviços prestados pelas empresas de rádio, televisão e telefonia. Tornando-o partícipe da elaboração e encaminhamento de projetos de lei voltados para a democratização das comunicações, hoje restritos a outras àreas de governo, como as Secretarias Especiais de Direitos Humanos e de Comunicação da Presidência da República.

Mas um novo Ministério das Comunicações é apenas parte do enfrentamento do problema. Por se tratar de questão-chave para a democracia a empreitada deve ser vista como prioridade absoluta do governo como um todo. Só assim haverá massa crítica e força suficientes para avançarmos no projeto nacional de banda larga oferecido por sistema público, acabarmos com a propriedade cruzada dos meios de comunicação, ampliarmos a abrangência de cobertura da TV Brasil e das emissoras de rádio da EBC, garantirmos a aplicação do dispositivo constitucional referente a obrigatoriedade de um percentual de programas regionais na televisão, criarmos uma agência reguladora para os serviços de radiodifusão capaz de, por exemplo, coibir a violação constante dos direitos humanos cometidos no rádio e na TV, entre tantas outras tarefas urgentes.

Sem esquecer a necessidade, prioritária, de impulsionarmos a existência de um grande jornal diário nacional, capaz de oferecer ao brasileiro uma outra visão de mundo, comprometida com a solidariedade e a justiça social, como fazia a Última Hora na metade do século passado.

Vamos buscar aquilo que de melhor o século 20 nos legou para, com a distribuição mais justa e acessível das novas tecnologias, passarmos a oferecer melhor não só as nossas riquezas materiais, mas também nossos preciosos bens simbólicos, fundamentais para a elevação do grau de civilidade do nosso país.



 

Gente de OpiniãoTerça-feira, 23 de abril de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

STF tem maioria para determinar recálculo de cadeiras na Câmara dos Deputados

STF tem maioria para determinar recálculo de cadeiras na Câmara dos Deputados

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou nesta sexta-feira (25) maioria de votos para determinar que a Câmara dos Deputados faça a redistribuição do

Governo Federal se compromete a incluir plano de carreira da ANM na LOA 2024

Governo Federal se compromete a incluir plano de carreira da ANM na LOA 2024

O Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (SInagências) conseguiu uma solução direta do governo após intensa articulaç

Deputado estadual Pedro Fernandes será o relator da CPI das Reservas em Rondônia

Deputado estadual Pedro Fernandes será o relator da CPI das Reservas em Rondônia

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Reservas foi instaurada em Rondônia para investigar possíveis irregularidades nos processos de criação

Ministro Paulo Pimenta trata sobre parceria entre Rede IFES de Comunicação Pública, Educativa e de Divulgação científica com a EBC e o Governo Federal

Ministro Paulo Pimenta trata sobre parceria entre Rede IFES de Comunicação Pública, Educativa e de Divulgação científica com a EBC e o Governo Federal

Na tarde dessa segunda-feira (06), o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM), Paulo Pimenta, esteve r

Gente de Opinião Terça-feira, 23 de abril de 2024 | Porto Velho (RO)