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Política - Nacional

Jurista Dalmo Dallari reafirma que PEC que muda demarcação de terras indígenas é inconstitucional


Juristas, governo e indígenas sustentaram ontem (13) a  inconstitucionalidade da PEC (215/2000) que transfere para o Legislativo a palavra final sobre a demarcação de terras indígenas. O debate ocorreu no plenário 3, com a presença de mais de 100 indígenas, e foi promovido pelo Grupo de Trabalho de Terras Indígenas instalado pelo presidente Henrique Alves (PMDB) durante o Abril Indígena e  Comissão de Legislação Participativa da Câmara.

Para o jurista Dalmo Dallari, a proposta fere a Constituição federal por desrespeitar a separação dos poderes e submeter ao Congresso "ato administrativo perfeito" exclusivo do Executivo. "A meu ver, ela é escancaradamente inconstitucional. Ela está afetando uma regra fundamental da organização política e jurídica brasileira, que é a separação dos poderes. Aprovar e ratificar demarcação é atividade administrativa do Poder Executivo".

O coordenador da Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas, deputado federal Padre Ton (PT-RO), impetrou na semana passada um Mandado de Segurança (MS 322620) para barrar a tramitação da PEC 215/2000. Subscreveram a ação 22 deputados. O relator já foi designado: é o ministro Roberto Barroso.

Com o presidente da Câmara, o deputado e o Grupo de Trabalho conseguiram suspender a instalação da Comissão Especial que irá avaliar a PEC 215 até o final de agosto. Esse compromisso foi feito no Abril Indígena, quando cerca de 300 lideranças ocuparam o plenário.  

Participação do Legislativo

Já o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) afirmou que a PEC 215/00 propõe que o povo brasileiro, representado pelo Legislativo, seja ouvido na questão das demarcações de terras indígenas. Serraglio relatou a PEC 215/00 na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Contestando o argumento do jurista Dalmo Dallari, Serraglio argumentou que "essa separação [dos poderes] visa apenas fazer com que nenhum poder seja dono absoluto do mando".

Serraglio lembrou ainda que a Constituição não diz que cabe exclusivamente ao Executivo a demarcação de terras indígenas, e sim à União, que também é integrada pelo Legislativo. “Ninguém quer tirar nada de ninguém, mas busca-se uma forma de ser justo com todos os brasileiros.”

O presidente da Comissão de Legislação Participativa, deputado Lincoln Portela (PR-MG), apresentou nota técnica da Associação Nacional dos Procuradores da República, que também classifica a proposta de inconstitucional. Na mesma linha, o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, Marisvaldo Pereira, disse ainda que a proposta pode acirrar os conflitos fundiários.

Sob aplausos das lideranças indígenas presentes no Plenário, Dalmo Dallari afirmou que se o Congresso aprovar a PEC ele vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal para arguir a inconstitucionalidade da proposta.

Decisões unilaterais

O autor da polêmica proposta, o ex-deputado Almir Sá, de Roraima, disse que apresentou a proposta com o objetivo de criar parâmetros claros de demarcação, sem ferir o direito e a cultura dos indígenas. Sá acrescentou que sua intenção era impedir decisões unilaterais do Executivo ao demarcar terras indígenas sem respeitar também o direito de produtores rurais, alguns já com titularidade definitiva de terra.

Sá enfatizou que respeita o direito e a cultura dos índios e argumentou que sua PEC não interfere no aspecto técnico das demarcações, que continuaria a cargo do Executivo. O deputado acrescentou que pelo seu projeto, o Executivo continuaria no comando da demarcação de terras indígenas, e que competiria à Fundação Nacional do Índio (Funai) propor a demarcação. “Por meio de mensagem do presidente da República, viria para o Congresso Nacional, que aprovaria ou rejeitaria. Se rejeitasse, voltaria para se corrigir imperfeições. Se aprovasse, passaria a ser uma demarcação feita por lei, e não mais por decreto".

Almir Sá citou ainda exemplos em Roraima, onde, segundo ele, a área indígena Raposa Terra do Sol e áreas de Ianomâmis foram ampliadas sem levar em consideração o direito de proprietários de terra com titularidade definitiva. “Estamos falando de direitos e, portanto, tem que se englobar o de todos os brasileiros.”

Mãe terra

Ao se dirigir diretamente a Almir Sá, a representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Sonia Guajajara, citou a atual crise de representatividade política e manifestou o temor de que a predominância de ruralistas no Congresso impeça a criação de novas terras indígenas.

"Se a gente entregar as terras indígenas para as mãos do Congresso Nacional, essas terras vão passar para as mãos do agronegócio e, assim, estaremos destruindo o meio ambiente do Brasil. Se essa PEC for em frente, sendo autor dela, você vai carregar isso de ser culpado pela extinção dos povos indígenas no Brasil, porque a terra para nós é muito mais do que um pequeno pedaço de terra negociável. Nós temos uma relação espiritual com a terra de nossos ancestrais. Nós não negociamos direitos territoriais porque a terra, para nós, representa a nossa vida. A terra é mãe e mãe não se vende, não se negocia. Mãe se cuida, mãe se defende, mãe se protege".

“Demarcação é ato técnico”

O ex-presidente da Funai Carlos Frederico Marés fez questão de frisar que demarcação é ato técnico: “marca-se aqui ou ali”. Com isso, ele quis dizer que deputados e senadores não teriam competência técnica para tratar desse assunto.

Por sua vez, o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, Marisvaldo Pereira, disse que a PEC não contribui para o atual processo comandado pelo ministério, no sentido de ampliar a transparência das demarcações por meio do diálogo e das soluções pacíficas.

Fonte: Mara Paraguassu
 

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