Sábado, 13 de setembro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Justiça

MPRO questiona constitucionalidade da lei sobre a RESEX Jaci-Paraná


MPRO questiona constitucionalidade da lei sobre a RESEX Jaci-Paraná - Gente de Opinião

O Ministério Público do Estado de Rondônia ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de medida cautelar, contra a Lei Complementar Estadual nº 1.274/2025. Uma norma, recentemente promulgada pela Assembleia Legislativa, institui o “Programa Estadual de Regularização Ambiental Diferenciado da RESEX Jaci-Paraná (PERAD-RO)”, permitindo, de forma provisória, a regularização de ocupações consolidadas dentro da Reserva Extrativista Jaci-Paraná. A Lei foi inicialmente vetada pelo Governador do Estado, mas o veto foi derrubado pela Assembleia Legislativa.

A ação questiona a constitucionalidade da nova norma, exigindo a suspensão imediata de seus efeitos, sob o argumento de que a Lei Complementar nº 1.274/2025 apresenta vícios formais e materiais.

A Lei impugnada permite a regularização temporária de ocupações consolidadas na RESEX Jaci-Paraná, por meio de autorização para uso diferenciado com prazo de 30 anos. A norma também extingue as avaliações administrativas e anistia responsabilidades civis, abrangendo ocupantes e empreendimentos que adquiriram produção da área ocupada. Além disso, prevê a extensão do objeto de ações civis públicas já ajuizadas, inclusive aquelas transitadas em julgadas, sob a justificativa de anuência estatal às ocupações.

Fundamentos da Impugnação

No entendimento do Ministério Público, a Lei Complementar apresenta abusos de origem e viola princípios constitucionais.
Do ponto de vista formal, o MP sustenta que o tema tratado é de competência privativa da União, além de tratar de temas de iniciativa do Poder Executivo, o que não ocorreu.

A Constituição Federal, em seu art. 24, inciso VI, confere à União a competência para estabelecer normas gerais sobre proteção ambiental, incluindo o uso de unidades de conservação. Nesse contexto, a Lei Federal nº 9.985/2000 (SNUC) define que as reservas extrativistas são áreas destinadas exclusivamente ao uso sustentável por populações tradicionais, vedando a ocupação irregular e a exploração econômica comercial. Assim, ao criar um regime independente de regularização fundiária na RESEX Jaci-Paraná, permitindo usos não previstos no SNUC, a lei estadual ultrapassa sua competência suplementar, invadindo matéria já regulada pela União e comprometendo o modelo nacional de proteção ambiental.

Do ponto de vista material, a instituição afirma que a nova lei viola o direito ao meio ambiente equilibrado e a proibição de retrocesso ambiental. O MP também observa que a medida fere princípios como a precaução e prevenção e a solidariedade entre gerações.

A ampla anistia prevê a lei para avaliações administrativas e civis aplicadas a ocupantes e empreendimentos que criam um cenário de impunidade, ao eliminar consequências jurídicas para atos praticados sob a justificativa de anuência estatal, fragilizando a responsabilização por danos ambientais.

A lei questionada também prevê a extinção do objeto de ações civis públicas já ajuizadas, independentemente da fase processual, incluindo ações já transitadas em julgadas, gerando preocupação quanto à violação do princípio da coisa julgada e à usurpação da competência do Poder Judiciário e atuação constitucional do Ministério Público na proteção ambiental, instaurando um cenário de insegurança jurídica.

Outro ponto destacado pelo Ministério Público é que a nova lei, ao autorizar a regularização das ocupações dentro da reserva, não estabelece critérios claros ou mecanismos para a recuperação de áreas já degradadas. “A norma ignora a necessidade de restaurar o meio ambiente local, não especificando como ou quando serão aprovadas ações para recompor a vegetação nativa ou compensar os danos ambientais causados nas últimas décadas”, afirma o Ministério Público.

Além do prejuízo à proteção ambiental, a lei pode agravar conflitos entre ocupantes tradicionais da RESEX — como comunidades extrativistas que sobreviveram da coleta de produtos da floresta — e os novos ocupantes regularizados. “Ao criar um programa amplo de regularização, sem ouvir e priorizar os direitos das tradições tradicionais, a medida tende a ampliar tensionada e ameaçar os modos de vida sustentáveis nessas comunidades, que já enfrentam pressão e redução de território”, observa o Ministério Público.

O MP ressalta ainda que a ausência de diretrizes para resolver disputas de uso da terra, somada à fragilização dos instrumentos de fiscalização e proteção, cenário de insegurança jurídica, capaz de estimular novas invasões e de dificultar a convivência pacífica na unidade de conservação.

Histórico de lutas pela preservação

A RESEX Jaci-Paraná, criada em 1996, é constantemente alvo de disputas judiciais e tentativas de flexibilização de sua proteção ambiental. O Estado de Rondônia já havia tentado, em 2021, reduzir de forma drástica a área da reserva por meio de outra lei, mas a iniciativa foi considerada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado. O entendimento foi confirmado pelo Supremo Tribunal Federal em 2023.

Dados de monitoramento ambiental relatados pelo MP apontam que, entre 2012 e 2022, a extensão de áreas ocupadas por atividades agropecuárias na reserva aumentou 239%, enquanto a área de floresta foi reduzida em mais de dois terços.

Urgência na proteção

Ao pedir medida cautelar para suspender a lei, o Ministério Público argumenta que a norma pode estimular novas invasões, além de ampliar o desmatamento e enfraquecer ainda mais a função da reserva extrativista, essencial para comunidades tradicionais e a preservação do bioma amazônico em Rondônia.

Tramitação da Ação

O pedido de medida cautelar foi encaminhado ao Tribunal de Justiça de Rondônia, que decidirá, inicialmente, sobre a suspensão imediata da lei. Em seguida, o mérito da ação será julgado, com possibilidade de declaração definitiva de inconstitucionalidade da norma. 

Gente de OpiniãoSábado, 13 de setembro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

STF condena Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão

STF condena Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta quinta-feira (11) o ex-presidente Jair Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão

Justiça determina plano de controle de mosquitos em assentamentos de Porto Velho após ação conjunta do MPRO e MPF

Justiça determina plano de controle de mosquitos em assentamentos de Porto Velho após ação conjunta do MPRO e MPF

O Ministério Público de Rondônia (MPRO) e o Ministério Público Federal (MPF) obtiveram decisão judicial que obriga a concessionária Santo Antônio En

 MPRO e Polícia Civil fortalecem parceria para intensificar o combate a crimes tributários e a recuperação de ativos para Rondônia

MPRO e Polícia Civil fortalecem parceria para intensificar o combate a crimes tributários e a recuperação de ativos para Rondônia

Em uma importante agenda de alinhamento estratégico, a coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Combate à Sonegação Fiscal e aos Crimes Contra a

Após recurso do MPRO, homem que matou casal em racha em PVH recebe nova condenação de quase 40 anos de prisão

Após recurso do MPRO, homem que matou casal em racha em PVH recebe nova condenação de quase 40 anos de prisão

O Ministério Público de Rondônia (MPRO), por meio do promotor de Justiça Marcus Alexandre de Oliveira Rodrigues, obteve no dia 1º de abril de 2025,

Gente de Opinião Sábado, 13 de setembro de 2025 | Porto Velho (RO)