Segunda-feira, 9 de junho de 2025 - 16h04
O
Ministério Público Federal (MPF) recomendou que não seja autorizado o aumento
do período de operação da cota de inundação de 90 metros da usina hidrelétrica
(UHE) de Jirau, em Porto Velho (RO). Para o MPF, a operação nesse nível só deve
ocorrer após a usina providenciar compensações às comunidades pesqueiras do
distrito de Abunã, que foram afetadas pela cota.
A recomendação foi endereçada à Diretoria de
Licenciamento Ambiental, do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e também à Agência Nacional de Águas e
Saneamento Básico (ANA), em Brasília, com prazo de cinco dias para resposta
sobre o acatamento ou não. Os órgãos são responsáveis por analisar e autorizar
a ampliação da regra operativa da usina.
O MPF instaurou um procedimento para apurar os
impactos da hidrelétrica de Jirau sobre a comunidade de Abunã e a continuidade
da responsabilidade do Subprograma de Apoio à Atividade Pesqueira com relação
ao Projeto Experimental de Operação da Usina de Jirau, na cota 90 metros. A
recomendação do MPF é uma das medidas adotadas pelo órgão nesse procedimento e também
decorre de informações de que há discussões em curso para autorizar a
hidrelétrica de Jirau a operar na nova cota a partir de 11 de junho deste ano.
Na recomendação, o MPF relata que o distrito de
Abunã é composto por pescadores. A tradicionalidade daquela comunidade já foi
comprovada por laudo antropológico elaborado por peritos do MPF. A ampliação do
período da cota de inundação da hidrelétrica de Jirau trará fortes impactos,
sendo o principal a necessidade de realocação de parte ou de toda a comunidade,
devido ao aumento da área alagada pela barragem.
Em 2017, a ANA definiu condicionantes e
compensações para autorizar a operação da hidrelétrica de Jirau na cota de 90
metros. Com base em estudos técnicos, a agência demonstrou que a cota de 90
metros causaria uma sobrelevação de 132 centímetros, afetando todas as casas.
Assim, todos os moradores precisariam ser realocados. Mas a hidrelétrica
ingressou com uma ação judicial alegando que não haveria os impactos descritos
pela ANA e que não seria necessária a realocação da comunidade.
No decorrer desse processo judicial, uma
perícia técnica indicada pela Justiça Federal demonstrou que, com a cota de 90
metros, haveria uma sobrelevação de 53 centímetros em Abunã, que afetaria
diretamente 104 casas da comunidade. Com o resultado da perícia, a hidrelétrica
de Jirau passou a reconhecer os impactos, mas os minimiza e defende que não há
necessidade de realocação de Abunã. O processo judicial ainda está em trâmite,
sem conclusão pela Justiça.
O MPF afirma, na recomendação, que não há
dúvidas sobre a existência de impactos à comunidade de Abunã. O órgão relata
que, mesmo que não haja risco à vida e que a capacidade destrutiva da água seja
baixa, conforme laudo técnico da perícia judicial, os moradores serão afetados
em seu bem-estar, atividades sociais e econômicas, condições estéticas e
sanitárias do meio ambiente e qualidade dos recursos ambientais.
Além de recomendar que o Ibama não autorize a
nova regra operativa para a hidrelétrica de Jirau e a ANA não conceda outorga
de uso ou qualquer outro instrumento autorizativo para a nova cota, o MPF
também orientou que os estudos a serem realizados contemplem a discussão com a
comunidade diretamente afetada. Também foi recomendado que seja facultada, ao
empreendedor e à prefeitura de Porto Velho, a participação nas discussões.
O MPF também lembra, no documento, que o
subdimensionamento dos impactos do complexo hidrelétrico do rio Madeira já foi
questionado na Justiça. Os empreendimentos foram condenados a realizarem novos
estudos e a adotarem novas medidas, por desconsiderarem vários impactos no
estudo primário do licenciamento ambiental.
Mudanças climáticas – Na
recomendação, o MPF ressalta que a maior cheia do rio Madeira ocorreu em 2014 e
afetou mais de 30 mil famílias em Porto Velho, distritos e cidades,
principalmente, no eixo da BR-364, além do estado do Acre. Em 2019 e 2025, as
enchentes deixaram submersos trechos da BR-425 e BR-364, isolando comunidades,
prejudicando o tráfego de veículos e o escoamento de produção, inclusive
afetando diretamente o Acre.
Neste ano, o rio Madeira esteve próximo da cota
de inundação, afetando diretamente mais de 8 mil pessoas e colocando mais de 32
mil pessoas em estado de alerta, segundo informações da Defesa Civil,
publicadas na imprensa local. A ANA também informou pela imprensa que o risco
de catástrofe ambiental é considerado moderado nos níveis em que se chegou.
Os procuradores da República Gabriel de Amorim
e Raphael Bevilaqua, autores da recomendação, alertam que as incontestáveis
mudanças provocadas nos padrões climáticos, até então conhecidos, têm produzido
catástrofes nos últimos tempos. As alterações nos padrões exigem – do poder
público e da sociedade - mudanças urgentes para que se consiga, pelo menos,
minimizar os impactos e desastres que afetam o meio ambiente natural e as vidas
humanas.
Eles ressaltam que, historicamente, o ciclo da
água está diretamente relacionado ao clima e as mudanças climáticas têm
alterado esse ciclo, seja provocando aumento de eventos hidrológicos em
determinados locais, com concentração maior de chuvas em período menor de
tempo, ou com períodos de seca prolongados ou mais intensos que o habitual.
O rio Madeira tem passado por mudanças drásticas em pouco tempo. Em menos de seis meses, passou-se de um período de seca extrema, com nível mínimo de 19 cm no rio, em outubro de 2024, para cheia forte, com quase 17 metros, em fevereiro de 2025, demonstrando, incontestavelmente, os efeitos destes fenômenos.
Procedimento Preparatório do MPF:
1.31.000.000977/2025-61
Ação judicial da hidrelétrica de Jirau:
1016749-02.2017.4.01.3400
Ação judicial do MPF sobre subdimensionamento
dos impactos do complexo hidrelétrico do rio Madeira: 0002427-33.2014.4.01.4100
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