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Artigo: Um olhar sectarista para a pós-modernidade em Rondônia


    
 Relendo um trabalho de meu nobre amigo e professor-mestre Pascoal, se assim posso chamá-lo por consideração, me vi fazendo analogias. Há algum tempo o vejo escrever sobre a história da educação no Vale do Guaporé, uma boa aula de história de Rondônia, mas não pude comparar a evolução com o tão propagado progresso que as Usinas estão trazendo para a minha cidade e junto com ele a pós-modernidade. Aí abro parênteses pois faço questão de usar o pronome possessivo, pois SOU portovelhense nascida no bairro Areal, e digo: não vejo nenhum prejuízo nisso, ao contrário por Estados onde passei (e foram muitos) não encontrei um povo igual ao meu: tão hospitaleiro e gentil até com os que o discrimina. Para não perder a alfinetada naqueles que insistem em criticar minha cidade, digo ainda que não somos nós que andamos atrapalhando o trânsito (isso por que batem nos peitos ou no diploma dizendo conhecer um trânsito ainda mais congestionado), não somos nós que jogamos lixo na rua pela janela do carro e nos quintais alheios, aliás, nem temos tantos carros assim (ah!ah!ah! índio não dirige), não choramos por nossa história porque não ganhamos dinheiro com ela, e já faz muito tempo que entendemos o nosso longo processo de colonização e ocupação.

Voltando ao meu comentário inicial, (sabendo que pouco escrevo porque o que escrevo “muitos” não querem ouvir, e até porque certo dia uma pessoa que considero muito sábia disse: quem se justifica é porque não aceita correção - creio nessa verdade e a percebo dia-a-dia na relação interpessoal com as pessoas com quem convivo, inclusive comigo mesmo) o que me chamou atenção é processo de chegada das Usinas, do Shopping, da transformação da rodovia, dos concursos públicos, da valorização de pontos históricos (que não são considerados turísticos), os condomínios ostentosos entre outras mudanças na paisagem e nos costumes de um povo, ou será que éramos povo?. Olhando o belo trabalho do professor Pascoal revi o processo de ocupação da nossa terra, eu sou fruto dessa ocupação, meus pais vieram do vizinho Acre, e meus avós do Nordeste, meus filhos sim são puramente portovelhense, com muito orgulho e certeza de representam bem a minha terra. E que ocupação!!!

Eu nasci quase cem anos depois do inicio da construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, quando chegaram aqui diversas culturas e houve um planejamento moderno do centro, com água,luz, teatro, comércio, geração de emprego, ostentação européia e tudo que tinha direito para sonhar. Será que tem alguma diferença na essência do que hoje se propaga com a chegada do progresso, digo da USINA? Me sinto em um dos contos de José de Alencar, um romance histórico e muito subjetivo, sem pensar no amanhã, como se o livro terminasse ali, ainda que o final fosse trágico ou verdadeiramente pós-moderno: ninguém sabe o que vai acontecer, só sabe que vai. Ah!Ah!Ah! Como se eu estivesse vendo a leitura de Brasil do cientista social Boaventura Sousa Santos. Desculpa a humildade no referencial teórico, mas é para isso que eles servem para serem contextualizadas, ainda que eu seja uma mera professora de história portovelhense, que não tem espaço porque não tem renome, afinal muitos que tem renome em nosso Estado não precisam de referencia teórica, precisam de referencia dentro dos gabinetes.
 
O que importa? As Usinas estão chegando. Isso me lembra um outro fato histórico da nossa região, um processo de ocupação que se diferencia do até aqui falado por causa do final da história que ficou para os moradores ou nativos da época, é visível o abandono, pois trata de um processo de ocupação territorial onde o “progresso”, leia autoridades e suas políticas públicas constituídas em gabinetes e com base na economia, estava apenas delimitando o território para não correr o risco de no futuro perder as terras para outra potencia européia. Ali valeu tudo inclusive quebrar os tratados. Eu estou falando do povoamento nos vale do Guaporé, Mamoré e Madeira, que se consolidou com a construção do Real Forte Príncipe da Beira, entre 1776 e 1783, aquele que esta “jogado” lá em Costa Marques (se não fosse o exército e os moradores locais), porque é muito longe e “não” gera renda, fundos de investimento (até o momento) imediatistas, e ainda tem que ter contrapartida para transforma em ponto histórico e turístico, não esqueçam novos diplomados das universidades particulares que não investem em pesquisa, o maior turismo é o que tem História, porque o lazer acaba, nascem outros pontos, mas o histórico permanece, ainda que chorando.
 
Enquanto escrevo fico me lembrando de regras, normas, e depois fico pensando o que aprendi e ensino: vencer o linear, transformar, criar, ousar, ter autonomia intelectual, e aí sempre vai ter um crítico, pouco importa, o que importa é que tenho opinião sobre a coisa pública, e estive na sala de aula ensinando o seu filho o que é o respeito, a ética e a humanização do ser, necessários para ele interpretar as questões do vestibular. Vamos a mais um fato histórico: as linhas telegráficas. Assim como as linhas do Marechal Rondon estavam chegando e impressionando, assim vêm às tecnologias de informação e comunicação. Todos se adaptando e procurando vencer o preconceito do analfabetismo tecnológico, puxa! Nossas escolas que gritem, peçam socorro, pois o “progresso” exige todos na “inclusão digital”, já pensou a corrida que nossos professores precisam dar, vão ter que saltar como a Maurren Maggi, a primeira mulher do atletismo brasileiro a ganhar uma medalha de ouro, para ganhar um espaço de ouro em Rondônia, sem direito ao pagamento por produtividade. Ah!Ah!Ah! Sabe por que meus colegas professores? Vêm aí os centros tecnológicos do Governo Federal, e só quem tem “cacife” vai entrar para trabalhar neles, puxa! Agora que eu lembrei, já foram selecionados os currículos, você sabia disso? Alguém lhe disse na escola? Pela lei de defesa da concorrência: “Laissez Faire. Deixa estar para ver como é que fica”. Lembrando: junto com os centros estão vindo os técnicos de Brasília e demais cidades do Brasil contratados para instalação, sabe porquê? Porque em Rondônia não tem profissional “renomado” para isso. Aprendi o renomado depois de levar um fora em um trabalho de pesquisa histórica, onde a preferência é para uma profissional renomada ainda que a mesma não seja historiadora e que seu livro seja apenas recortes bibliográficos, e que seu testemunho pela história seja um verdadeiro fracasso enquanto ativista pela seriedade da causa. Dê um cargo e ela coloca os técnicos para escreverem seu livro. Bem feito a “nossa universidade” não tem um “Curso de História”, qualquer um pode escrever e dizer que é historiador, o profissional não é regulamentado, não tem conselho, tem um sindicato pelego que só luta por causas visíveis, que nem estão mais tão visíveis, pois faz tempo que não vejo meu salário. Ah!Ah!Ah!

Voltando ao assunto, eu podia ainda falar do período da borracha, dos garimpos, da construção das hidrelétricas, da BR 364, do BEC, do presídio na ilha do Madeira que se acabou. Alias os alunos da escola Rio Branco sabem disso, fizeram até um vídeo maravilhoso em novembro do ano de 2004, que está atualíssimo, e aí necessário se faz lembrar a frase de um aluno em relação à construção: “Você afundaria a sua própria história?”. O que ficou de toda a nossa história de ocupação? Muitos foram embora, outros só reclamam da cidade, mudaram a paisagem sem planejamento, concursos abertos para todos. Não sou contra ver minha cidade tão movimentada, sou contra a falta de planejamento estratégico e valorização de quem ficou aqui para viver. Será que vão ter indústrias? Não ouço falar. Vai ver vão abrir vagas para zeladores, faxineiras, meia pá, entre outros do segmento quando da construção dos condomínios ostentosos, que taparão o pôr-do-sol mais bonito da região, pois quem vai lá para a praça da prostituição, ops! da ferrovia ver o Sol. Olha agora possa ser que o pessoal diplomado consiga entender quando aparecia na programação da televisão um advogado dando entrevista dizendo que trabalhava como gari, ou sobre a regulamentação da prostituição como profissão para pagar faculdade, ou até mesmo volta o discurso da capital do contracheque. Concursos públicos fechados para os residentes aqui? Não, acho que não, aqui não tem gente capacitada, ué?! Cadê os inteligentes que vieram de fora. Já sei vamos fugir para o município de Candeias do Jamari, talvez o seu Chico consiga um empreguinho para nós, lá não cresce mesmo.

Quando pesquisávamos sobre a construção da Usina com os alunos, em novembro do ano de 2004, para construir o roteiro encontramos um referencial teórico adequado: o historiador inglês Eric Hobsbaw, ele diz: “A função do historiador é lembrar as coisas que muita gente faz questão de esquecer”, isso me faz referendar meus conceitos, ou seja, assim como a história do presídio foi esquecida nos planos da construção da Usina, assim foram esquecidos os portovelhenses, os excluídos, os verdadeiros rondonianos, por incrível que pareça veio tanta gente para cá e eles ainda falam que não tem gente capacitada aqui, será que os mesmos não são capazes. O historiador é um profeta no seu tempo por isso falo que a história se repete com mais intensidade, e o ambientalista pode assegurar o que digo: vai ficar pior do que estar por que o homem se autodestrói com sua vaidade e ambição. Os pós-moderno que me perguntem depois e eu direi qual o próximo divisor de águas, e só os que crêem entenderão. 

Fonte: AURIMAR LIMA (PROFESSORA DE HISTÓRIA E JORNALISTA DRT 425/RO)

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