Quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009 - 20h09
O SALÃO DE ARTES PLÁSTICAS DE RONDÔNIA: Desconstrução e reconstrução do olhar
Por Ariel Argobe(*)
O Salão de Artes Plásticas de Rondônia SART, que será aberto oficialmente nesse sábado, dia 14 de fevereiro de 2009, a partir das 19 horas, é o maior acontecimento do Estado voltado para a produção mais representativa das linguagens contemporâneas em artes visuais, reunindo artistas locais e de outras regiões do país, cujos trabalhos sinalizam na direção da pesquisa, da experiência, da reflexão e da busca de novos conceitos no exercício do pensamento plástico rondoniense.
Editado pela primeira vez em 1992, o SART hoje, na sua décima segunda edição, aponta na direção do amadurecimento do discurso visual local, consolidando uma trajetória de confrontos e conflitos entre o que se produz aqui, e agora, e as tendências e movimentos vindos das grandes metrópoles e de regiões mais desenvolvidas do país, cujo discurso visual se espraia nos conceitos e perscrutações do comportamento plástico dito vanguardista e atualizado ao nosso tempo.
Em suas primeiras edições, como era de se esperar, o SART enfrentou a reação furiosa e desdenhadora do público e do artista local, acostumados com a ditatorial arte em moldes acadêmicos que aqui reinou por longas décadas, fazendo-se representar por obras concebidas, quase sempre, na técnica tinta óleo sobre a clássica tela de tecido esticado em chassi de madeira, assinadas por artistas consagrados como Afonso Ligório e José Fona e, mais recentemente, Irai de Oliveira, Aquênia Lira, dentre outros nomes expoentes da representação acadêmica. Público e artista de olhar conservador, cuja experiência e contemplação máxima com as artes visuais se limitavam, até então, e na maioria das vezes, à participação na missa dominical da Catedral do Sagrado Coração de Jesus, correndo o olhar nos afrescos de Padre. Ângelo Cerri e de seus pupilos que, ainda na primeira metade do século XX, foram os responsáveis pela decoração das naves principal e co-laterais da Catedral de Porto Velho. Um público alfabetizado ao sabor das formas e regras visuais das academias clássicas, somando gosto estético com um grupo de artistas abarcados pelos conceitos da concepção artística academicista. Pensamento cultural, estilo de vida e acontecimento artístico que convergiam para o bucolismo da paisagem amazônica e a vida pacata de uma cidade cravada na selva, muito longe dos grandes centros urbanos do país.
É nesse contexto que há mais de dez anos se instalou o instigador e irrequieto SART. Não que aqui já não houvesse atitudes, ainda que solitárias, rumando na direção de um discurso plástico universalizador, com clara tendência contemporânea. Alguns artistas e exposições já anunciavam, isoladamente, verdadeiras experiências visuais de proa - falando num bom caboquês. Citamos, a exemplo, a exposição montada no Saguão da Caixa Econômica Federal, em 1994, denominada de A Arte Amazônica Universal, que decididamente apontava na direção de novas experiências, ainda que materializada com objetos artísticos das clássicas linguagens da pintura e do desenho ou, melhor dizendo, do desenho pintado e da pintura desenhada.
O Salão de Artes Plásticas de Rondônia é uma atitude da instituição pública do Estado, responsável pela gestão e desenvolvimento das políticas para o campo artístico que, a partir daquela primeira edição, traz para si, reunido e organizado na forma de salão, o discurso plástico de vanguarda que se vislumbra em terras karipunas e karitianas. E, mais do que isto, o SART se instalou, muito provavelmente, sem consciência de sua mais nobre missão: a afirmação de novos ideais estéticos, ainda que fincados numa caminhada sem pressa, na direção da desconstrução paulatina de olhares e atitudes acadêmicas, dissolvendo estruturas conservadoras e superando, desta feita, o academismo aqui tardio e duradouro.
Como divisor de águas, o Salão acomoda na gaveta da insipiente história das artes visuais de Rondônia, reconhecendo suas contribuições e seus valores estético-históricos, nomes abarcados pelos conceitos e atitudes acadêmicas. Artistas pioneiros, consagrados e reconhecidos pelo público local, como nossos grandes e primeiros mestres de um estilo clássico tardio.
O SART abre a cortina da estética do presente, do mundo contemporâneo, do agora. Ao público apresenta artistas comprometidos com a construção de novos olhares, cuja atitude plástica do objeto traduz o pensamento incentivador da pesquisa, da busca de comportamentos visuais inovadores que possibilitem a ruptura com a tradição. Reapresenta à sociedade beradera o objeto artístico local, ressignificado, construído ou reorganizado com novas regras do discurso estético, que traduz melhor a nossa nova realidade, incorporando, no objeto de arte, elementos e pensamentos das vanguardas dos grandes centros do país, relidos no contexto local do imaginário caboclo, que vê expandir, diante de si, uma nova cidade, emoldurada por novas megas obras arquitetônicas, anunciadoras de uma nova era, de um novo tempo para a urbe tupiniquim, que agora se define com claras linhas e edificações urbanísticas do futuro presente. Uma nova cidade, invadida por milhares de novos olhares e gostos estéticos, consumidores ávidos de um novo tempo.
A arte apresentada nas últimas edições do SART é marcada pela diversidade da concepção de idéias, de novas tecnologias e matérias, visibilizando o artista com posturas inovadoras e seus objetos de arte construídos não somente com materiais tradicionais, como o óleo sobre tela, mas concebidos também com qualquer outro tipo de material disponível no seu entorno, retirado do cotidiano urbano, das florestas e rios. Artistas de ação renovadora, que tornam possível a criação e recriação do objeto de arte com definições ainda mais radicais, como a arte conceitual e a arte performática. Com isso, amplia-se o conceito de arte, que passa a incluir, além de objetos palpáveis, idéias e ações. Uma nova arte que estabelece interface com outras ciências do conhecimento, refletindo conflitos e indagações da sociedade pós-moderna.
*Ariel Argobe é Artista Plástico e membro do Coletivo de Discussão Cidade, Cultura e Inclusão.
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