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Gente de Opinião

Entrevista

Leitura de Ônibus com Manelão


  

LEITURA NO ÔNIBUS: Seu compromisso com Rondônia

Manelão - Está difícil entender Rondônia. Só para dar um exemplo, no Acre a gente é sempre bem recebido. Mas, quando envolve questões de lá, aí o acreano puxa para ele. Aqui existe muita falta de compromisso das pessoas que vieram pra cá.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: Somo surgiu a profissão de chaveiro?

Manelão - Comecei a mexer com chaves em 1966. Quando tinhaLeitura de Ônibus com Manelão - Gente de Opinião que viajar a S. Paulo, por exemplo, era obrigado a informar antecipadamente à Polícia Federal, pois era um trabalho que envolvia questões de segurança. Havia um controle rígido, já que um profissional dessa área era suspeito. Agora está tudo mudado. Para dar exemplo, já passaram pela minha loja mais de 40 profissionais. Hoje eu não ensino mais ninguém, cansei! E o problema nem é o cara sair daqui e ser meu concorrente. Se for um concorrente leal, tudo bem. O que acontece é que, se você vai a qualquer parte – como na Av. Amazonas, por exemplo – deve ter uns 20 chaveiros, só que quase ninguém está regular, não tem firma nem Nota Fiscal. Aí, ele faz chave que não abre e, quando você vai reclamar, te enrola. Num dia está aqui, daqui a um mês abre em outro ponto. Para poder cobrar mais barato, ele trabalha com material que não presta, de 2ª qualidade. O cliente, que está certo em procurar o serviço mais barato, só não repara que está levando produto sem qualidade. Chave é que nem medicamento: Com somente 30 modelos daria para fazer tudo, mas existem mais de 900. A indústria lança um modelo novo, com um risquinho a mais e pronto! Já é um produto novo. Eu tenho buscado gente em todos os cantos do Brasil. O último veio de Brasília. Paguei passagem, estadia, alimentação, além de um bom salário. Só que, chegando aqui, o cara não sabia nada e eu tive de mandar de volta, foi mais despesa, fiquei com o prejuízo. Eu busco no profissional muito além do conhecimento. Eu busco a responsabilidade, a confiança. Afinal, a gente trabalha com a confiança do cliente. Quando eu mando um funcionário numa casa fazer um serviço, ele é policiado por mim. O cliente precisa ter certeza que quem está indo à sua casa é uma pessoa séria, de responsabilidade, e isso tudo tem um custo. Infelizmente, a maioria dos clientes não vê por este lado, dando total preferência ao fator “preço”.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: E a firma?

Manelão - Minha firma completou 41 anos de atividade neste ano de 2007. Eu gostaria muito que ela completasse 50 anos com o mesmo dono, com o mesmo CNPJ, mas vejo que vai ser difícil. Fui eu que abri isso aqui quando eu tinha 16 anos. Eu posso até ter problemas, mas não vou mudar a razão social e o CNPJ; prefiro negociar. Isto é uma questão de moral, de princípios.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: E sua participação como empresário?

Manelão - Nestes anos como comerciante, eu participei de muitas entidades, fui fundador do CDL, da Associação Comercial, ainda que nunca quisesse ser presidente. Afastei-me de todas. Eu tenho consciência que já fiz algumas coisas por Rondônia.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: E a população de Rondônia hoje?

Manelão - Se você sair 100 km de P. Velho já vai ver outro tipo de vida, até nas músicas. Lá a agricultura e pecuária mandam. Aqui, nem a economia do contra-cheque está mais funcionando. Aqui nem os políticos são daqui.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: Como era Porto Velho antiga?

Manelão - Na década de 1960 a cidade (de Porto Velho) era muito pequena, mas era bem melhor de se viver. Todo mundo se conhecia, a gente podia dormir de janelas abertas. A cidade ia até ali na atual (av.) Brasília. Aqui na frente (da cidade), de noite, a gente saía para pegar tartaruga, jacaré. No igarapé do Guapindaia, onde depois aterraram e se instalou a Pernambucana (em frente à Praça Jonathas Pedrosa, onde hoje funciona uma loja de móveis e eletro domésticos), a gente ia pescar traíra. Então, a cidade era mais aconchegante. Quando tinha um crime o cara não tinha nem para onde fugir. Quando havia briga, no final os dois iam e se apresentavam na delegacia, senão o delegado mandava buscar e aí era pior. Eu aprendi com um estrangeiro que esteve por aqui e que dizia: “Povo que não tem história não tem memória”. Ora, eu mesmo briguei muito com o falecido Chiquilito (Erse, ex-prefeito), para criar o museu da imagem e do som de Porto Velho. Ora, é só gravar! Por exemplo: Eu sei de alguns fatos que aconteceram aqui, mas que eu não vivenciei. As pessoas morreram e se perdeu o elo. Eu conto uma história porque quem vivenciou me contou e eu repasso, a meu modo. Nós temos aí a Dona Labibe, com 99 anos. Até hoje não gravaram com ela. Isso tudo acontece porque muitas das pessoas que vieram pra cá não têm compromisso.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: Como foi o começo da profissão de chaveiro?

Manelão - Eu fui para S. Paulo estudar e, na volta, em fevereiro de 1966, montei o chaveiro. Tem gente que chega aqui, pergunta se foi meu pai que fundou a firma, e se admira quando eu falo que fui eu mesmo que iniciei. Meu pai tinha um jipe para o qual eu passei uma semana para fazer uma chave na plaina, na fresa. No dia que eu peguei o jipe para dar umas voltas, o meu pai me tirou a chave e eu levei uns cascudos. Aí eu fui com meu irmão pra São Paulo e lá passei uns seis meses apanhando de um velho português, para quem eu tinha quase que adivinhar qual ferramenta ele queria quando estava trabalhando. No fim, compramos uma máquinas e eu voltei para cá. Naquela época não havia chaveiro aqui. Aliás, tinha um barbadiano que fazia chave na marreta e que passava até 15 dias para fabricar uma cópia. Ele forjava a chave para fazer. Meu primeiro cliente foi o Cláudio Feitosa, a quem eu fiz uma homenagem quando completei 35 anos – mas ele só soube que seria homenageado uma hora antes. Isso tudo, e muito mais, vai comigo quando eu morrer. E o Chaveiro Gold fecha, não tem sucessor.
 

LEITURA NO ÔNIBUS: O Chaveiro Gold, a cultura e a Banda do vai Quem Quer

Manelão - Hoje o Chaveiro Gold se tornou um point da cultura, onde muita gente se reúne. Muita coisa é criada aqui dentro. Tem uns compositores que trazem suas letras e vão aí, pra trás, onde até parece que tem uma força. O pessoal diz que, aqui, a criação aparece. A gente faz isso por prazer, pela cultura. Para ter uma idéia, eu estou sendo processado pelo Ministério Público por perturbação do sossego público causada pela Banda do Vai Quem Quer, que saí só uma vez por ano, durante somente cinco horas e só no sábado de carnaval. O processo é porque o som estava dois decibéis acima do permitido. Isso, que devia tirar o meu estímulo, acaba me dando é mais incentivo. E aí eu faço que nem o Zagalo: “Vocês vão ter que me engolir”.

Fonte: Luiz Carlos Albuquerque

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