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Gente de Opinião

Silvio Santos

Maria Antônia Almeida - A historia da Matinta Perera


 Maria Antônia Almeida - A historia da Matinta Perera  - Gente de Opinião

Desde sábado, a casa número 1416, da rua Agenor de Carvalho, onde
reside a matriarca da família Silva/Almeia, está em festa. Filhos,
filhas, genros e noras, que moram em outros estados e cidades,
chegaram de surpresa, para festejar os 70 anos de nascimento da
senhora Maria Antônia da Silva Almeida. Entre os que chegaram, estava
o casal Gel e Young Blood, pois, justamente por conta da chegada desse
casal, fomos convidados a degustar uma feijoada na residência da dona 
Antônia. O que pensávamos que seria uma recepção a Gel e ao Blood, na
verdade, era o inicio da festa de aniversario de dona Antônia. Logo de
cara, fomos recepcionados pelo seu Antônio um velho conhecido nosso,
já que o entrevistamos ano passado. Costeleta e carré de porco foi o
prato de entrada para uma daquelas feijoadas, onde o que menos
encontramos é o feijão, tantos são os ingredientes. A descontração
tomava conta do ambiente com a família toda reunida, são dez filhos,
25 netos e 5 bisnetos. “Por sinal estão todos aqui em Porto Velho”. A
tarde transcorria entre um gole de cachaça da boa e uma latinha de
cerveja. “A jatuarana está pronta”, anuncia uma das filhas de dona
Antônia e os adeptos do peixe moqueado correm para a mesa para
degustar o nosso peixe mais nobre. Enquanto Gel e Young contam sobre o
trabalho artístico, que estão desenvolvendo em Manaus desde o ano
passado, para o Manelão, Caula, Luiz e para esse escriba, um dos
filhos lembra as proezas do seu Antônio quando atuava como seringueiro
nos seringais de Nova Olinda do Norte. “Certa vez ele achou que nossa
casa teria que ter um tapete de couro de onça. Então carregou a
espingarda de prego e foi caçar, quando uma onça passou perto de uma
samaumeira, ele apertou o gatilho e pregou o rabo da pintada na
samaumeira, depois de dar um talhe de terçado na testa da bicha, e ela
saiu em disparada, deixando o couro que foi transformado em tapete lá
em casa”. Dona Antônia nesse ínterim, lembra das histórias sobre
Matinta Perera e a tarde fica mais agradável. Foi aí que resolvemos
gravar a entrevista que segue com a dona Maria Antônia da Silva
Almeida. A festa de aniversário de 70 anos da dona Maria Antônia
acontece hoje (20), no clube Guadalupe na rua Guaporé em Porto Velho 

E N T R E V I S TA

Maria Antônia Almeida - A historia da Matinta Perera  - Gente de Opinião
Zk – Qual o seu nome completo e onde a senhora nasceu?
Maria Antônia
– Maria Antônia da Silva Almeida nasci no município
amazonense de Borba.

Zk – Seus pais faziam o que?
Maria Antônia
– Eles eram agricultores.

Zk – A senhora ficou em Borba até que idade?
Antônia
– Passei minha infância toda em Borba, depois de casada, fui
morar em Nova Olinda do Norte. Minha vida em Borba foi toda
trabalhando na roça, praticamente não tive infância, estudei muito
pouco por falta de oportunidade, o que aprendi deu para compreender
algumas coisas.

Zk – Qual o seu trabalho na roca?
Maria Antônia
– Era na plantação de tabaco, macaxeira, mandioca,
frutas, e na juta.

Zk – Como é o trabalho com a juta?
Maria Antônia
– A juta produz uma malva que dá fibra, com essa fibra
se montava os fardos e vendia. A gente fazia o fabrico e no fim do
fabrico, o patrão ia buscar a produção que chegava a quatro toneladas.
Era assim, no verão a gente trabalhava na roca e no inverno na malva,
na juta.
NR - A juta é uma herbácea (Corchorus capsularis) da família das
tiliáceas, largamente cultivada para a obtenção de fibras têxteis. A
juta alcança a altura de três a quatro metros, cujo talo possui
aproximadamente 20 milímetros, crescendo em climas úmidos e tropicais.
As plantas florescem entre quatro a cinco meses depois de semeadas e
inicia-se a colheita antes ou depois da floração. A fibra útil está
entre a casca e o talo interno, com extração feita pelo processo de
maceração. Suas haste e caule devem ser cortados rente ao solo com
foices ou terçados, sendo depois limpos das folhas e postos em feixes
dentro da água.
A temperatura quente e úmida da região amazônica favorece sua
fermentação e facilita a maceração em dez dias, permitindo assim que a
casca se solta das hastes sem que se rompam as fibras da parte lenhosa
do talo. Depois são submetidas à nova imersão para lavagem e postas
num varal para enxaguar-se, empacotando-se a fibra em seguida. As
melhores qualidades de juta distinguem-se pela robustez das fibras e
pela cor branca e brilhante do talo; as qualidades inferiores têm a
cor dos talos mais escuros, menor comprimento das fibras, coloração
mais acinzentada e menos resistentes. O principal componente da juta é
a celulose, apresentando boa afinidade para corantes diretos. (fonte -
Amazon View).

Zk - Nesse meio tempo, não apareceu nenhum boto querendo conquistar seu coração?
Maria Antônia
– Não, do jeito que o senhor ta querendo insinuar não.
Tinha muito boto no rio, mas eles não atacavam as nossas canoas não.
Essa história de boto conquistador ouvi falar muito pelos mais
antigos. Eles contavam que o Boto chegava às festas vestido de branco
e com chapéu que era para cobrir o buraco que eles tem no meio da
cabeça. Ali ele escolhia a moça mais bonita e encantava, levava para o
fundo do ria e depois ela surgiu grávida. O filho que nascia ficava
conhecido como “Filho do Boto”. Na minha época isso já não acontecia,
mas as estórias eram contadas quando as famílias se reuniam em frente
das casas para apreciar a lua cheia e comer peixe moqueado a beira da
fogueira.

Zk – Em Borba, era comum se ouvir histórias sobre cobra grande, a sucuri?
Maria Antônia
– Lá onde a gente morava, aconteciam umas coisas
entranhas, de repente o rio que tava calmo, quando a gente via, vinham
àquelas ondas bem altas. Diziam que o banzeiro era provocado pela
Cobra Grande, ou seja, quando ela se mexia. Eu cheguei a ver muitas
vezes isso acontecer. Outras histórias, só ouvia contar. Os antigos
também contavam histórias sobre Curupira e Mapinguari.

Zk – E Matinta Perera?
Maria Antônia
– Contavam muitas histórias sobre matinta Perera.
Inclusive, lá onde morei por algum tempo na Ilha do Carapanatuba que
também pertence ao município de Borba. Rapaz, todo dia no escurecer,
passava aquilo assobiando e os moradores diziam que era ela a Matinta
Perera. Quando foi um dia, por volta das seis horas da tarde, eu
estava no barranco duma ribanceira, escutei na casa do meu vizinho
aquele assobio. Foi um assobio assombrador, acontece que o vizinho
estava do outro lado do rio, portanto não poderia ser ele assobiando
dentro da casa. Foi então que escutei aquele grito de cachorro
apanhando mesmo e os gritos, “caein, caein, caein...”. Daqui a pouco
os cachorros se calaram e eu voltei a escutar aquele assobio que para
mim era da “bicha” (Matinta Perera), quando vi o assobio tava bem
perto de mim e eu toda arrepiada, corri pra dentro de casa.

Zk – Dizem que a Matinta Perera é uma velha que pede café essas
coisas. O que a senhora acha disso?
Maria Antônia
– Me contaram essa história. Conheci um senhor que dizia
assim, ele chamava as pessoas que ele chamava de “fadista” e quando a
Matinta passava assobiando o “Fadista” chamava para tomar café no
outro dia. – “Ê Matinta, amanhã vem de manhã cedo tomar um café
comigo”, quando era no outro dia aparecia alguém para tomar café na
casa dele, era a Matinta Perera.

Zk – Bom! Quando a senhora se entendeu, já existia a festa de Santo
Antônio em Borba?
Maria Antônia
– Já! Fui batizada lá na igreja de Santo Antônio de
Borba. A procissão é no dia 13 de junho e a gente ia passar essa festa
na cidade. Meu pai tinha uma voadeira e um batelão possante que a
gente viajava. Saímos da nossa localidade (sítio) no dia 8 ou no dia
10 de junho no rumo da Borba para passar a festa e só regressava no
dia 14.

Zk – Existia arraial no pátio da igreja?
Maria Antônia
– Até hoje tem! Bom eram os leilões que aconteciam
durante a quermesse, eram leiloados coxão de porco assado, galinha, e
outras coisas, como animais vivos (porco, galinha, cabrito, bezerro
etc.).

Zk – Com quantos anos a senhora se casou?
Maria Antônia
– Meu filho, eu não tive juventude. Às vezes eu ignoro
esses meninos que hoje em dia casam cedo. O que acontece é que hoje em
dia os meninos têm mais conhecimentos do que a gente naquela época.

Zk – Por falar nisso, como era namoro naquele tempo?
Maria Antônia
– Meu pai era muito rígido. Não deixava a gente
conversar com ninguém, nem dar a mão para rapaz nenhum. Quando chegava
visita em casa, para ver as pessoas, tínhamos que ficar olhando pelas
brechas nas paredes. A gente só na sala quando ele pedia para levar um
café, servir uma água.

Zk – E o casamento foi em conseqüência dessas proibições?
Maria Antônia
– Me casei com 15 anos de idade com o António Manoel da
Silva Galvão um cortador de seringa 8 anos mais velho que eu. Até hoje
vivemos juntos, são 55 anos de convivência.

Zk – Já sabemos que a senhora é de Borba. Falta saber o nome da
localidade do município de Borba?
Maria Antônia
– A propriedade da nossa família chama São Joaquim em
homenagem ao meu avô que se chamava Joaquim. De lá para a cidade de
Borba são duas horas de viagem de canoa. Ainda hoje a localidade
pertence a nossa família.

Zk – Quantos filhos a senhora e seu Antônio tem?
Maria Antônia
– Nasceram 12 desses dois faleceram e os 10 estão vivos.
Por sinal estão todos aqui em Porto, vieram para a festa dos meus 70
anos que acontece nesta segunda feira dia 20 de abril. São 25 netos e
5 bisnetos.

Zk – Naquele tempo as meninas moças tinham praticamente a obrigação de aprender as chamadas prendas domésticas, como aprender a cozinha,
lavar e passar roupa, cuidar da casa etc. A senhora teve essa
educação?
Maria Antônia
– O Que sei hoje em dia foi um dom que Deus me deu.
Quando me casei e fui morar em Nova Olinda do Norte, Onde a gente
morava era uma ilha – Carapanatuba, e do lado do Rio Madeira tinha uma
tia minha que era professora e o meu filho mais velho atravessava todo
dia numa canoinha pra ir pra escola, aí os outros dois já estavam
ficando bom de estudo também e eu ficava temerosa de acontecer alguma
coisa com eles na travessia do rio. Foi aí que optamos em nos mudar
para Nova Olinda do Norte.

Zk – Quanto às prendas domésticas?
Maria Antônia
– Casei com 15 anos sem saber das prendas domésticas, já
que trabalhava na roça mesmo. Depois de casada aprendi a costurar, era
uma costureira em Nova Olinda considerada mesmo, tanto que quando
disse que ia me mudar de lá, muita gente encomendou costura minha para
ficar de lembrança. Aprendi a costurar através dos meus filhos. Eles
precisavam de roupa e como eu não tinha condições de pagar porque eram
muitos meninos e o meu marido se tacava pros altos dos rios em busca
de trabalho e eu ficava com eles na cidade. Lavava roupa pra fora,
depois aprendi a costurar as roupas dos meus meninos e o povo começou
a ver as roupas que eu fazia pro’s meus filhos, passaram a encomendar.
Naquele tempo a gente não chamava tecido, era corte de fazenda. Para
encurtar a conversa, para estar na moda em Nova Olinda do Norte era
preciso ter uma roupa feita por mim pela dona Antônia costureira.

Zk – E na culinária?
Maria Antônia
– Aí só sei fazer comida caseira, assado, cozido, frito.

Zk – E verdade que a senhora é massagista?
Maria Antônia
– Sou. É isso que digo que foi um dom que Deus me deu,
porque não estudei para ser massagista, na realidade fiz curso, mas
depois que já praticava há muitos anos. Aqui em casa e cheio de gente
que vem fazer massagem, é doutor, doutora, empresário e gente do povo.

Zk – Quais os tipos de massagem que a senhora faz?
Maria Antônia
– Massagem relaxante e massagem ortopédica.

Zk – Esse negócio de rezar pra quebranto é com a senhora também?
Maria Antônia
– Não! Isso é com meu marido.

Zk – A senhora coloca osso no lugar?
Maria Antônia
– Coloco sim. A gente faz o diagnóstico, às vezes a
pessoa está com os ossos fora do lugar. Ainda hoje (sábado) coloquei o
braço de um garotinho no lugar. A mãe trouxe aqui eu toquei e vi que o
osso estava fora do lugar e então fiz uma massagem e coloquei o osso
dele no lugar. Faço massagem em pessoas com torcicolo, distensão
muscular, tendinite etc.

Zk – Os unguento usados nas massagens, é a senhora mesmo que faz?
Maria Antônia
– Alguns sim, a maioria compro nas farmácias, mas, uso
muito a andiroba na mistura de alguns mesmo os comprados nas
farmácias.

Zk – A senhora aplica massagem em mulher grávida?
Maria Antônia
– Meu filho faço muita massagem para consertar criança.
Apalpo o neném na barriga da mãe vejo a posição como ele está se
desenvolvendo no útero, se está torto eu conserto.

Zk – Isso quer dizer que a senhora atua também como parteira?
Maria Antônia
– Já fiz muito parto. Hoje não faço mais porque tenho
esse meu filho que é deficiente e não posso me ausentar por muito
tempo de casa, mas já fiz muito parto aqui em Porto Velho também.

Zk – Se uma pessoa estiver interessada em pegar uma massagem com a
senhora, o que deve fazer, a senhora atende?
Maria Antônia
– Claro que atendo, tem uma salinha ali onde atendo as
pessoas que vêm fazer massagem.

Zk – Vamos divulgar o endereço?
Maria Antônia
– Aqui é a rua Agenor de Carvalho antiga rua 4 número 1416.

Zk – Além dos cremes, o que a senhora usa durante a sessão de massagem?
Maria Antônia
– Costumo usar incenso. Música não. Se eu fosse mesmo
atender todos que me procuram, eu não tinha tempo nem pra comer.

Zk – Voltando lá pro começo dessa entrevista. A senhora falou que
namorar era difícil. Por que?
Maria Antônia
– No começo do meu namoro com o Antônio aconteceu o
seguinte: A gente estava na sala ele no meio, eu dum lado e minha
irmão do outro, meu pai vinha chegando da caçada e foi colocando suas
três armas na parede da sala, depois virou pro Antônio e foi
indagando. Com qual intenção ele estava ali junto da filha dele.
Acontece que esse daí (apontando pro seu Antônio) tinha fama de
garanhão e meu pai já estava de orelha em pé. Aí o Antônio fez uma
conversa mole e então meu pai disse que ele tinha que casar. Acontece
que a gente ainda nem se conhecia direito e meu pai já foi falando em
casamento. Então nosso namoro durou pouco tempo, estava próximo do mês
de junho.

Zk – E casamento aconteceu em que dia?
Maria Antônia
– No dia 14 de junho no outro dia da festa de Santo
Antônio nós nos casamos na igreja de Santo Antônio de Borba. Eu de véu
e grinalda. Até hoje aos trancos e barrancos, estamos vivendo.

Zk – Para encerrar. Um conselho para a juventude?
Maria Antônia – É ser bom consigo mesmo, é se conformar com o que você
tem e ser a pessoa que é. Não adiante querer ser mais. O fundamental é
amar e servir! 

Fonte: Sílvio Santos / www.gentedeopiniao.com.br  / www.opiniaotv.com.br 
[email protected] 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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