Domingo, 5 de outubro de 2025 - 09h04
Existe
uma sensação peculiar que se instala com o passar dos anos e a vertiginosa
mudança do mundo ao nosso redor: a de se tornar um estranho na terra onde se
fincou raízes. Em Porto Velho, vivi a vida, criei família e fui parte ativa de
transformações que moldaram o que hoje é Rondônia. Minhas memórias não são
apenas lembranças; são testemunhos vivos. Assisti à transição do Território
para Estado, testemunhei a saga da pavimentação da BR-364, e vi nascer
municípios que hoje pulsam, como Ariquemes, Cacoal, Espigão do Oeste, Rolim de
Moura, e até mesmo Mirante da Serra, que era apenas uma linha próxima de Ouro
Preto. Tive participação na caravana que foi aos portos do Pacífico para pedir a
construção da Bioceânica, vi as usinas de Samuel, Santo Antônio e Jirau serem
inauguradas viajei pela já extinta
BR-319 rumo a Manaus por terra-marcos de uma época de pioneirismo e
desbravamento.
Como
professor e escritor, tive o privilégio de conhecer e interagir com ícones de
Rondônia e do Brasil, pessoas como Humberto da Silva Guedes, Capitão Silvio
Gonçalves, Teixeirão, Milton Santos, Paulo Vanzolini, Darcy Ribeiro-só para
citar alguns. Para alguém que, como todo velho, vive de passado, essas
histórias são relíquias minhas que pouco interessam. O que passou, passou. Não
se vive de passado. O fato insofismável, todavia, é que Rondônia mudou, e Porto
Velho, mais ainda. Houve um tempo em que eu me considerava uma pessoa bastante
conhecida. Não se entrava em um avião, ou mesmo em qualquer lugar movimentado
da cidade, sem cumprimentar uma boa quantidade de conhecidos. Até uns dois anos
atrás, essa familiaridade ainda persistia: entrar em um local e ser abordado
por três ou quatro pessoas que, em sua maioria, eram ex-alunos, conhecidos de
palestras ou simplesmente pessoas que me identificavam. Eu conhecia as
autoridades, suas origens; havia uma conexão social palpável.
Uma parte
dessa mudança, talvez, seja minha, por ter me afastado um pouco dos microfones
e câmeras. No entanto, o motor principal é a velocidade da transformação da
cidade. Até mesmo os detentores de cargos mudam com uma rapidez que só os mais
envolvidos conseguem acompanhar. Muitos entram e saem da esfera pública sem
sequer tempo de se tornarem minimamente conhecidos
Esta
percepção atingiu um pico na noite de ontem, em um jantar. Fui ao restaurante Cuzco,
de comida peruana, na antiga Arigolândia, um local que já abrigou o tradicional
"Caravela do Madeira" do Paiva, um nome que ressoava em Porto
Velho, que estava completamente lotado, talvez, mais de duas centenas de
pessoas. O objetivo era menos a comida e mais a música de Priscila e Carlos Guere, que com seu ritmo
latino mantêm a noite acesa.
O
verdadeiro choque, contudo, não foi a excelente música (embora um pouco alta
para os meus ouvidos, por conta da acústica do local), mas sim a ausência de
conhecidos que me envolveu me fazendo, pela primeira vez, em muitos anos, me
sentir como se estivesse fora da cidade. Não reconheci ninguém. Nenhum garçom,
nenhum atendente, nenhum cliente. Em um minuto, a ficha caiu: eu sou um desconhecido
em Porto Velho. Nenhuma das pessoas presentes, tirando os músicos, me
conhecia ou me era familiar.
Como tudo
na vida, esse novo status de desconhecido tem seu lado bom e seu lado ruim. O
lado bom foi a liberdade: ninguém me incomodou, uma privacidade completa. Desfrutei
de uns chopes e de uma boa música sem a necessidade de conversas forçadas ou a
obrigação social de cumprimentos e salamaleques. Há um certo conforto em ser
apenas mais um. O lado ruim foi o rompimento do vínculo, a confirmação
silenciosa de que a Porto Velho que ajudei a construir e onde fui um rosto
conhecido já não existe mais, pelo menos não da mesma forma. E também me veio a
percepção de que isto deve também estar acontecendo com muitas pessoas mais
antigas de Porto Velho: em suma, a vida, o tempo, a cidade nos engoliram e
reduziram a nossa familiaridade. A
grande verdade é que, agora, posso dizer sem medo de errar: sou quase tão
desconhecido em Porto Velho quanto em Fortaleza, minha cidade natal. É o preço da modernidade, da migração
incessante e do crescimento acelerado que, embora traga progresso, leva consigo
a intimidade da pequena (ou média) cidade para substituí-la pela indiferença da
metrópole. Resta-nos, a nós, os guardiões do passado, equilibrar a nostalgia
com a aceitação dessa nova e desconhecida paisagem.
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