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Serpa do Amaral

Um rondoniense tenta ser prefeito em Mato Grosso do Sul


 Um rondoniense tenta ser prefeito em Mato Grosso do Sul  - Gente de Opinião
Candidato rondoniense
Berlange Andrade

O fato é um caso ímpar na história política local. Enquanto muito aventureiros recém chegados no Estado procuram ocupar cargo públicos na prefeitura e na câmara municipal de Porto Velho, um rondoniense radicado há trinta anos no Mato Grosso Sul tenta se eleger prefeito de um dos municípios sul-mato-grossenses: chama-se José Berlange Andrade, tem 59 anos, é filho da pioneira Yolanda Andrade, foi um dos fundadores do Bloco do Sol, freqüentou os Colégios João XXIII e Dom Bosco. No Mato Grosso do Sul, tornou-se líder sindical e fez carreira como servidor do poder judiciário, chegando a ser juiz de direito e titular da vara de Terenos/MS, localizada a 20 km da capital, onde pleiteia ser prefeito pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB, com o apoio do PRB / PPS / DEM / PRTB / PMN / PTC / PSB / PV / PSD / PC do B). Na mídia nacional, Berlange ficou conhecido por ter realizado audiência num boteco lá pras bandas do pantanal, por não ter no distrito do litígio lugar mais adequado para realizar os procedimentos judiciais (veja matéria “Juiz quer detonar a República dos Bacharéis”).

Apoio moral

Para dar apoio moral ao único rondoniense a pleitear um cargo político fora do Estado, um grupo e amigos e familiares montou uma espécie de comitê simbólico, em Porto Velho, e, na pena de Serpa do Amaral, mandaram uma prosa poética em incentivo ao candidato. Veja:

 

Berlange: um guerreiro que nasceu para fazer o bem

O juiz José Berlange Andrade é ante de tudo um humanista, um forte, um sonhador dedicado às causas sociais, que foi ungido pelas bênçãos de Deus para cumprir uma missão de justiça e trabalho no meio dos homens, na cândida cidade de Terenos. Berlange Andrade é um lutador que toca a vida com o mesmo carinho, responsabilidade e cuidado que um velho peão de boiadeiro toca sua boiada pela estrada afora.

Nascido nos sertões de Rondônia, em meio a grande floresta amazônica, peregrinou ainda muito jovem para os campos da vaquejada e da soja, ficando raízes nas terras do Mato Grosso do Sul.

Aí no Mato Grosso do Sul, torrão de homens valentes e honrados, plantou semente de vida e colheu um casamento, os filhos Yan Garoto, Raul Neto, Penélope e a Dra. Yara Morena, os netos, amigos e seguidores, companheiros e admiradores, colaboradores e cúmplices do seu humanismo sem limites.

Enfrentou temporal e tempestade, lutou como um leão pelos ideais de justiça que conjuga, pelos valores essenciais que dignificam o homem vivente em sociedade. Chorou suas lágrimas de amor e ódio, suas lágrimas de alegria e dor. Viveu suas torrentes de paixão e luta. Ingressou no Poder Judiciário, tornou-se sindicalista, combateu o bom combate dos guerreiros iluminados, defendendo o justo para todos os homens sob a jurisdição de sua toga, se preocupando especialmente com os menos favorecidos, com aqueles que padecem, pior que todos, da sede perene pela água benta da justiça social. Até em boteco fez audiência, para provar que a essência da verdadeira justiça não está nos móveis e utensílios de um foro bem apetrechado de bens materiais. O bem maior está no coração do homem. Reconhecer e cultivar esse bem, compartilhando-o entre as partes com eqüidade e justeza e legalidade é o grande desafio de verdadeiro magistrado.

Como um Ulisses tupiniquim viajou por todos os quadrantes do Mato Grosso do Sul, cumprindo com zelo e dignidade, altivez e autoridade, fidelidade e devoção, todas as tarefas que o Poder Judiciário lhe outorgou. E assim serviu à justiça brasileira de forma apaixonada pela paz social, apaixonado pela oportunidade de servir ao povo, apaixonado pela gente do Mato Grosso do Sul, apaixonada pela resolução dos conflitos, apaixonado pela nobreza da missão a que se propôs desempenhar na vida profissional. Ele serviu ao povo, servindo à pátria, servindo à família, servindo ao Estado Democrático de Direito e servindo a Deus.

Hoje o povo de Terenos tem na candidatura do juiz Berlange Andrade a belíssima oportunidade de colocá-lo na cadeira de prefeito, prestigiando-o como grande líder que é, enaltecendo-o como homem digno que é e fazendo dele um grande administrador, um homem em missão de paz e de trabalho, um homem em missão de realizar grandes obras e zelar com honestidade e transparência pelos reais interesses da gente trabalhadora e honrosa da cidade de Terenos.

Se Terenos me permite, como rondoniense da gema, digo: cuidem bem desse homem, ouçam o que ele tem a dizer, escutem seu coração, vejam a beleza de ser humano que ele é, façam dele o prefeito de vocês, façam dele um porta-voz dos seus clamores, caminhem com ele de braços dados, corações unidos em comunhão de fé e esperança por dias melhores para todo o povo dessa cidade. Juiz de vocês ele já foi. Que ele seja agora o prefeito, o líder de uma exemplar administração, o realizador dos sonhos que vocês, terenenses, têm em vossos espíritos e mentes. Amem esse homem, porque tenho certeza que ele ama vocês com todo o fogo do seu coração de guerreiro que nasceu para fazer o bem.

Antônio Serpa do Amaral Filho

 

JUIZ QUER DETONAR A REPÚBLICA DOS BACHARÉIS

O juiz rondoniense que atua no Mato Grosso do Sul, José Berlange Andrade, iniciou uma guerrilha urbana nas barbas dos latifundiários pantaneiros. Ele vem chamando a atenção da mídia nacional por sua ousadia e criatividade: realizar audiência judicial em um boteco, à falta de outro lugar mais adequado, numa cidadela daquele Estado, chamada Ponte do Grego. A cena inusitada vem chocando os operadores do direito mais ortodoxo e fazendo a alegria dos causídicos e magistrados da corrente progressista, vamos chamar assim.

Justiça, para o cidadão comum, é coisa que só funciona para ladrão de galinha e congêneres. Nunca para a elite e classe média alta. Ciência do Direito, para o povo brasileiro em geral, é palavrão do qual a gente tupiniquim não faz a mínima idéia. No mesmo diapasão, Polícia é aquele órgão do governo que tem a missão de subir o morro e prender e/ou matar traficantes de droga. Tribunal é coisa de gente chique e inteligente, que fala uma língua pomposa, cheia de efeitos prosódicos de difícil doma. Ou seja, boa parte da população brasileira vê nas instituições judiciárias uma redoma de gente bacana, poderosa e partícipe de uma confraria onde se fala um idioma tão ininteligível quanto o grego: o jurisdiquês.

Até pouco tempo éramos chamados - somos de fato - de República dos Bacharéis. Ter um filho advogado era o sonho dos velhos coronéis da colônia, da República da Espada e da República Velha. Todavia, há quem tenha botado a boca no trombone. No auge do seiscentismo barroco, Gregório de Matos, o Boca do Inferno, já disparava suas farpas satíricas às faculdades portuguesas de além-tejo: adeus prolixas escolas/de reitor, meirinho e guarda/lentes, bedéis, secretários/que tudo somado é nada.

Ele, também bacharel, formado na Coimbra dos choupais, filho da elite colonial, foi um dos primeiros a denunciar a falácia encenada pelas instituições incumbidas de tratar e dizer o Direito, seja no conotativo de valor ou justo, seja na concepção de norma de conduta, seja na de ciência que estuda essas normas disciplinadoras da ação humana em sociedade, ou seja na idéia de direito enquanto faculdade subjetiva inerente ao sujeito que participa cidadanicamente do convívio social - que pode, ou não, fazer valer seu direito objetivo nas barras das tribunas judicantes.
O fato é que o distanciamento entre Povo e Justiça data dos primórdios da nossa civilização. A ideologia da República dos Bacharéis, engendrada de maneira a conceber apologeticamente a figura do operador do direito e suas respectivas instituições, criou um paredão muito mais alto e mais resistente que o Muro de Berlim entre a Sociedade nacional e a Justiça, enquanto instituição. Esse fosso abismal a separar o povo do mundo da lei perdurou mesmo depois de proclamada a república pelo velho Deodoro da Fonseca, que o fez, observe-se, à margem da participação popular, atrelado unicamente a meia-dúzia de milicos positivistas. Recapitulando o dever de casa, diríamos: Dom João VI aqui lançou âncoras sem o povo o chamasse, portanto à revelia deste; a Independência não teve participação popular; a Constituição da Mandioca manteve o zé-povinho longe do poder de decisão; a famosa Proclamação da República deu-se à margem da gente brasileira; em seguida um Estado só fez a Revolução de 30, o Rio Grande do Sul, e, em 37, entregou o poder a um só homem, Getúlio Vargas; um pequeno hiato de democracia..., e pau na moleira de novo: Ditadura Militar de 64.

Quer dizer, atravessamos historicamente diversas épocas de transformações sociais, políticas, econômicas e jurídicas sem que o povo de fato tenha atuado como agente partícipe essencial nessas páginas históricas. Quando muito a gentalha serviu de bucha de canhão na Guerra do Paraguai, principalmente os negros. Quando muito os descamisados se acotovelaram e resistiram no arraial de Canudos, tentaram a Sabinada ou a Revolta dos Alfaiates, ou pelejaram com a Balaiada nos confins do Pará. Nada disso deu pé. A classe dominante foi muito astuta e politicamente bem mais articulada que os pés-descalços tupinambás.

Daí que hoje quando um juiz vai a um botequim, nos arredores de Terenos, realizar atos processuais que objetivam tanto aproximar o povo das suas instituições quanto dizer o direito e ao mesmo tempo desmistificá-lo perante aquele que detém o poder originário, portanto anterior à própria Constituição e aos códigos infraconstitucionais, é mal visto e mal dito, como uma ameaça à dessacralização e à popularização da justiça. O juiz Berlange Andrade é perigoso, sim. É um perigoso agente revolucionário a serviço da modernização do Brasil, do entrelaçamento cidadânico povo-judiciário e da efetivação de um poder judiciário que não tem medo de dizer o justo direito no bar da esquina, comprovando que a integridade de um Poder da República não está na forma como ele realiza seus atos processuais, mas sim no seu real compromisso em servir à sociedade com denodo, com independência funcional, qualidade técnica e grandeza jus-sociológica de espírito. O magistrado José Berlange é um homem-bomba: na pacata Terenos, onde existe demanda de 900 famílias pela posse da terra em assentamento de reforma agrária, ele detonou a primeira banana de dinamite nos pilares da República dos Bacharéis, da República dos Coronéis e da República dos Togados. Talvez porque queira mesmo soerguer, com seu gesto lúcido, a República dos Sem Anéis, onde a Justiça não tem medo do cheiro de povo.

Antônio Serpa do Amaral

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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