Segunda-feira, 20 de janeiro de 2014 - 14h02
"O primeiro marco da nova casa de ensino superior foi o Museu Rondon, em homenagem ao grande pacificador
das etnias existentes em MT" (Novis). Mulheres Kaiowá fotografadas por Paulo Ribas em Dourados (MS).
GABRIEL NOVIS NEVES
De Cuiabá
Havia um tempo que era pejorativo chamar alguém de índio ou morar na terra, ainda, deles.Nasci, fui educado, estudei e, quando tive oportunidade, tentei apagar esse preconceito.
Como o índio morava na selva, hoje quase em extinção, denominei de “Universidade da Selva” a burocrática Universidade Federal de Mato Grosso, isso em 1971, durante o Primeiro Encontro dos Reitores das Universidades Públicas em Brasília.
Era a nossa meta de intenções para esta parte do Brasil - tão cobiçada pelas nações estrangeiras!
O primeiro marco da nova casa de ensino superior foi o Museu Rondon, em homenagem ao grande pacificador das etnias existentes em nosso Estado.
Para meu orgulho sou filho do “Bugre do Bar”, apelido que o meu pai ganhou pela cor indígena da sua pele.Percorri toda a área de atuação da Missão Anchieta ao norte do nosso Estado, cuja sede ficava localizada em Utiarity.
Seus membros eram jesuítas, e desenvolveram um trabalho extraordinário durante o choque inevitável dos homens brancos, dito civilizados, com os povos não aculturados.Muitas mortes foram evitadas, porém, o número de mortos quase dizimou civilizações inteiras.
Aprendi muito também com os irmãos Villas-Bôas, com Apoena e com Chico Meirelles.Todos foram contratados como professores colaboradores da nossa incipiente Uniselva
Fui médico de índias e operei algumas delas. Posteriormente, tivemos conosco na Uniselva o saudoso cacique Mário Juruna, de quem recebeu o seu famoso gravador. Brizola, que era a favor do respeito às minorias, o elegeu Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, a eterna capital da cultura brasileira.
Diante de tanta sabedoria e felicidade que encontrei nesses povos das florestas, sempre indagava o motivo de terem lhes tirado quase tudo. Bens materiais e imateriais. Afinal eles eram os verdadeiros donos.
Certa ocasião, assistindo no Xingu o Quarup, em homenagem a Noel Nutels, o russo médico dos índios, Cláudio respondeu a minha pergunta inquietante sobre a razão de tanta felicidade dos povos ainda não aculturados.
“Eles não conhecem o dinheiro, nem o casamento, nem a propriedade”, disse-me o antropólogo do mato.
“Não tinham noção da posse das coisas ou pessoas”.
“Fico imaginando - continuou o pensador - até que ponto foi ‘negócio’ comprarmos, massacrando os verdadeiros donos das terras, o conforto, a riqueza material em troca da felicidade perdida.”
Como era bom ter nascido no Brasil antes de 1500, e ser chamado de índio!
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