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Vila Serra do Navio agora é patrimônio cultural


 
ADÉLIA SOARES (*)
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MACAPÁ, Amapá — Uma parte da história recente, do extremo norte do Brasil, foi contada nesta quinta-feira, 15, na reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, no Rio de Janeiro. Na ocasião, os conselheiros aprovaram a proposta de tombamento da Vila Serra do Navio. 

A Vila com pouco mais de 3,7 mil habitantes foi projetada pelo arquiteto brasileiro Oswaldo Bratke com o objetivo de abrigar os trabalhadores da Indústria e Comércio de Minério (Icomi). Concebida para ser uma cidade completa e auto-suficiente, uma verdadeira ilha no meio da floresta, foi a experiência precursora na região amazônica na formação de uma cidade de Companhia, voltada para a exploração mineral.

Bratke escolheu pessoalmente o lugar. Estudou os tipos de habitação da região, os hábitos dos moradores, e todos os dados referentes ao meio ambiente. Visitou vilas de mineração construídas em outros países como Estados Unidos, Inglaterra, Venezuela, Chile, Colômbia e Caribe. 


Sem cercas e muros

A Vila Serra do Navio não possuía cercas ou muros, parecia um grande quintal a ser compartilhado por todos os moradores. A distribuição das moradias refletia o organograma da empresa, com dois setores bem demarcados. Em um deles ficavam as casas dos operários e o outro era destinado aos funcionários graduados. 

O Centro Cívico abrigava uma escola com parque infantil; um hospital com centro de saúde e unidade de enfermagem com 30 leitos; um clube social com cine-teatro; uma igreja ecumênica; e um clube esportivo com equipamentos e quadras que tinha como objetivo principal a confraternização. Tudo isso mantendo a estrutura social já existente na região, porém com melhores condições habitacionais.


Exploração do manganês

As notícias da existência do minério de manganês no Vale do Rio Amapari surgiram antes do presidente Getúlio Vargas criar o Território Federal do Amapá, em 13 de setembro de 1943, mas foi somente dois anos depois que as amostras colhidas pelo garimpeiro Mário Cruz foram identificadas com alto teor de manganês. 

O interesse de exploração veio com o parecer do especialista Glycon de Paiva, em 1946, que confirmou as grandes minas no território. Para ele, a exploração mineral não seria apenas uma fonte de riquezas, mas poderia vir a ser uma forma de projetar o Brasil no comércio internacional e, inclusive, se tornar um elemento estratégico para a política externa do País.
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Vila com pouco mais de 3,7 mil habitantes foi projetada pelo arquiteto brasileiro Oswaldo Bratke /FLIRK

Vencendo uma concorrência que incluiu mineradoras estrangeiras, a Icomi assinou o contrato de exploração mineral em 1947 e, em 1951, confirmou a existência de quantidade superior a 10 milhões de toneladas de minério. As obras e os trabalhos da mineradora no então Território Federal do Amapá consolidaram uma política de ocupação que remonta ao século XVIII, visando a garantir a presença portuguesa e, mais tarde, de brasileiros no norte do Brasil. Mas a experiência em Serra do Navio dinamizou economicamente outras áreas do território, com a atração de brasileiros de todo o país que se instalaram no Amapá. Apesar da expectativa criada em função da exploração do manganês, a reserva se esgotou antes do previsto e a Icomi deixou a região no final da década de 1990 com reflexos importantes para a conservação da estrutura da vila.

Trabalho do Iphan

O Iphan acredita que a Vila Serra do Navio, apesar das transformações sofridas pela falta de conservação e por intervenções inadequadas, mantém as características originais que a distinguem na história da ocupação do norte do Brasil, na arquitetura e no urbanismo brasileiros. 

Durante 10 anos o Iphan trabalhou na investigação histórica, com levantamentos fotográficos e arquitetônicos referentes à vila, sua implantação, suas instalações e edificações. A proposta de tombamento foi debatida com os moradores, com foco na recuperação da memória social local e na busca de soluções adequadas para resgatar as características que fazem da Vila Serra do Navio uma cidade absolutamente singular.

Para o Iphan, o desafio de implantar uma cidade com essas características, no meio da floresta amazônica, levou à criação de um verdadeiro monumento da arquitetura e do urbanismo, onde as soluções propostas pela corrente modernista dialogam e interagem com as soluções construtivas locais, com o clima e a vegetação e principalmente com a cultura do lugar. Por essa razão, o Iphan propõe o tombamento da Vila, levando em consideração seus valores paisagísticos, históricos e artísticos.


Conselho Consultivo

O Conselho que avalia os processos de tombamento e registro, presidido por Luiz Fernando de Almeida, presidente do Iphan, é formado por especialistas de diversas áreas, como cultura, turismo, arquitetura e arqueologia. 

Ao todo, são 22 conselheiros de instituições, entre as quais, o Ministério do Turismo, Instituto dos Arquitetos do Brasil, Sociedade de Arqueologia Brasileira, Ministério da Educação, Sociedade Brasileira de Antropologia e Instituto Brasileiro de Museus.
 
(*) É assessora de imprensa no Iphan
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