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Matias Mendes

FUMO: As Razões do Vício


O combate ao tabagismo, encetado a partir dos anos noventa do século passado, tem provocado uma profunda mudança no comportamento do povo brasileiro. A legislação no sentido de restringir o uso do fumo foi avançando aos poucos até se transformar em instrumento de caça às bruxas, levando algumas pessoas ao extremo da intolerância no trato com fumantes. Com todas as razões que temos para evitar o fumo, há que se admitir que existem antitabagistas que chegam a ser chatos, muitos deles até ex-fumantes que somente abandonaram o vício depois de proibidos por seus médicos. Como todo crstão-novo,  os ex-fumantes tornam-se radicais em termos de oposição ao fumo, algo assim como querer tirar dos fumantes remanescentes o prazer que desfrutaram por anos a fio sem a menor culpa. Fumar não é nada saudável, faz muito mal à saúde, não é hábito que deve ser ensinado a ninguém, mas convenhamos que há também antitabagistas que passam dos limites, são intrometidos, pernósticos, preconceituosos e tão nocivos quanto o próprio fumo.

Depois da onda do antitabagismo, com o cinismo que caracteriza muito bem a sociedade brasileira, ninguém procurou esclarecer ao público que muitos dos fumantes remanescentes de hoje foram praticamente compelidos a fumar quando ainda adolescentes, bombardeados pela intensa publicidade que incentivava o uso do fumo, que fazia parecer até que sem cigarros não havia masculinidade possível, que associava a imagem do fumante a tudo que havia de melhor no gênero humano, os grandes guerreiros, os grandes esportistas, os intelectuais mais notáveis, os galãs mais bem sucedidos do cinema, enfim, era como se não fosse possível ter sucesso longe do fumo.

Quem conhece a publicidade atual de produtos como a Coca-Cola e outros artigos de consumo muito difundidos pode muito bem imaginar o que acontecia em relação ao fumo nas décadas de 20, 30, 40, 50, 60 e 70. A publicidade era tanta que até mesmo havia um número bem expressivo de médicos que eram fumantes. A rapaziada era convertida ao uso do fumo antes mesmo da primeira experiência sexual, até porque era muito divulgada a mística de que os encontros amorosos eram consumados com o cigarrinho do depois.

Seria muito bom que a sociedade brasileira conhecesse os mecanismos perversos que levaram milhões de jovens ao uso continuado do tabaco, entre os quais eu estou incluído como tantos outros da minha época. É verdade que sou um tipo de fumante com a capacidade de abandonar o fumo até por cinco anos, por dois anos, por três anos, mas não deixo de ser tabagista como qualquer fumante inveterado dos muitos que perambulam por aí. E como adquiri tal vício inconveniente? Ainda adolescente, com 16 anos, trabalhando no mato, fumando para espantar mosquitos e abelhas que infernizam a vida dos que labutam pela mata. Anos depois, treinando por longas temporadas nas selvas amazônicas entre indivíduos de todas as raças e de nacionalidades diversas, aprendendo doutrinas rígidas, técnicas apuradas, sem ouvir de qualquer monitor lições de restrição ao hábito de fumar, acabei consolidando o vício que me foi incutido na adolescência.

No entanto, mesmo sendo fumante, criei duas filhas que não fumam e não bebem, muito embora também não falem francês, não falem espanhol, não sabem nadar, não sabem atirar, enfim, não sabem nada das coisas positivas que faço muito bem. Felizmente, porém, sabem ler e escrever muito bem, fato que indica que não transmiti pela educação e o convívio os meus hábitos inconvenientes a ninguém. Sempre fiz questão de dizer aos jovens que fumar é um hábito nocivo, conquanto não faltem vícios bem piores. Muito mais felizmente ainda, meus vícios indesejáveis sempre foram restritos a drogas permitidas, nunca ultrapassaram a linha da legalidade. Não defendo o vício que tenho, não é saudável, não é bonito, não ajuda em nada, mas defendo o direito de abandoná-lo quando bem desejar, sem patrulha de radical nenhum, sem chantagem de qualquer natureza, sem a interferência de toupeiras que nem sequer sabem dizer porque fumamos e como fomos induzidos a fumar, sem terrorismo e sem discriminação.

Sou fumante, não importa se temporário ou inveterado, mas não sou nenhum cidadão de segunda ou terceira categorias, eu pago minhas contas, crio meus filhos e enterro meus mortos, coisa que muitos antitabagistas metidos e pregar moral não são capazes de fazer. Ego sum qui sum. Cogito, ergo sum.

Fonte: MATIAS MENDES  -  matiasmendespvh@gmail.com
Membro fundador da Academia de Letras de Rondônia.
Membro correspondente da Academia Taguatinguense de Letras.
Membro correspondente da Academia Paulistana da História.
Membro da Ordem Nacional dos Bandeirantes Mater.
Membro do Instituto Histórico Geografico de Rondônia

 

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