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ABRAÇOS DE AFOGADOS - Por Frei Betto


 
Frei Betto

Em caso de naufrágio é comum o desespero leva vítimas a se agarrarem umas às outras, na esperança de salvação. É o que ocorre hoje no Brasil. O governo Temer, com apenas 3% de aprovação, afunda a olhos vistos, sob o peso das graves acusações de atividades criminosas de sua cúpula. E a Câmara dos Deputados cobra o alto preço a ser pago por ter, legal mas injustamente, promovido dupla obstrução da Justiça.


Retrocedem os direitos sociais, definham os orçamentos vitais destinados à saúde e à educação, multiplicam-se as benesses corporativas, a ponto de flexibilizar inclusive a lei que pune empresas coniventes com o trabalho escravo.

O PSDB, que penou 13 anos no gélido desterro dos sem governo federal, agora se agarra com unhas e dentes nos cargos oferecidos por Temer. Ah, como é bom ser ministro! (Ainda que o salário seja análogo ao trabalho escravo).

Mas nem todos os tucanos embarcam na nau sem rumo do PMDB. Muitos temem resultar em drástica derrota eleitoral em 2018 o partido abrigar-se à sombra de quem se afoga no descalabro ético e sonega direitos sociais, com visíveis efeitos no aumento da violência e de endemias.

Quem serão, em 2018, o protagonista e o figurante? O PSDB como vice de um candidato do PMDB ou vice-versa? Nada disso, bradam alguns tucanos. O PSDB terá candidato próprio e, por isso, é hora de desembarcar da canoa furada de Temer.

A disputa no arraial tucano é de peixeira afiada brilhar no escuro. Doria a quem doer, mas o geral do cenário intrapartidário é para Henrique nenhum botar defeito, nem o Meirelles, que semeia ventos e colhe tempestades, nem o Fernando, que insiste no desembarque antes que os tucanos tenham que pagar alta fatura pelos erros e desvios do PMDB.

O PT, recuperado do coice peemedebista que o desalojou do Planalto, começa a fazer as contas de seu cacife eleitoral em 2018. E na direção inversa de alguns caciques tucanos, aproxima-se do PMDB. Julga que este não tem ninguém capaz de se apresentar como candidato a presidente. De novo, terá de se conformar com o papel de vice. 

O PT conta com uma estrela que muitos julgam em ascensão e, outros, em extinção. Mas todos sabem que Lula não pode ser menosprezado nem como candidato nem como cabo eleitoral. 

Estenderia ele de novo a mão aos novos Malufs? Para aqueles que, no PMDB, ostentam igual folha corrida?

Ora, se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. A turma do PT que trocou o projeto de Brasil pelo projeto de poder exibe seu pragmatismo e rasga a fantasia de esquerda acuada: o que importa é ganhar as eleições! Ainda que o fim não justifique os meios, os meios são escassos e devem se adequar ao fim. Às favas os escrúpulos!

A turma do PT que resgata o projeto de Brasil grita “basta!” É hora de voltar às origens. Esquerda, volver! Confiar nos movimentos sociais. Nada de perdoar aqueles que impuseram o gosto amargo da derrota. 

Enquanto PSDB e PT tentam apaziguar suas lutas intestinas, os avatares surgem das sombras e proclamam “abaixo a política!” A salvação virá do empreendedorismo, do moralismo, da economia livre das amarras partidárias.

No filme “O arrependimento”, de George Abuladze, o tirano de uma pequena cidade morre e é sepultado. Uma mulher desenterra-o a cada noite, para que ninguém esqueça aquele que encarnara a opressão. 

A corrupção e a falta de prospectiva política capaz de assegurar “um outro Brasil possível” serão os cadáveres insepultos nas eleições de 2018.

 

Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do poder” (Rocco), entre outros livros.
 

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