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Vinício Carrilho

ABERRAÇÃO IV: Brasil aquartelado - Por Vinício Martinez


Nos últimos dias muitos disseram que o país estava submerso no Estado de Sítio, depois da invasão de manifestantes em Brasília no dia 24.05[1]. Porém, é pior do que isso, pois se fosse Estado de Sítio (art. 137 da CF/88) o ritual seria outro, incluindo-se a anuência do Congresso Nacional. Ainda que o governo federal tenha tentado passar a conta para a presidência da Câmara Federal, sendo esta recusada publicamente por Rodrigo Maia, o que tivemos foi um cerco militar, uma quartelada, na Capital Federal.

O flagrante desvio da filosofia constitucional democrática se confirma pela invocação do art. 142 da CF/88, com apoio na lei Complementar nº 97 de 9/6/1999, uma vez que as forças policiais regulares do Distrito Federal seriam mais do que suficientes para conter a violência. Cerca de apenas 10% do efetivo policial foi deslocado para a Esplanada dos Ministérios. Ou seja, a decretação de GLO (Garantia de Lei e Ordem) chocou-se violentamente contra a Carta Política.

Se a GLO aplicada às manifestações em Brasília foi ação inconstitucional – completamente diversa em finalidade das perpetradas, por exemplo, na Copa, no Rio de Janeiro –, então, configura-se como ação de ditadura não-esclarecida ao povo e ao Poder Judiciário.

Antes do enlevo militar no golpe incipiente (GLO), Policiais Militares, por sua vez, usaram munição letal para atacar militantes sindicais e políticos[2] – além das bombas de gás proibidas em teatro de guerra. Isto ilustra o fato de que as polícias, de forma geral, têm cada vez mais escamoteado os limites legais, quando não são a ponta de lança paramilitar agindo como milícias mercenárias contratadas por algum Bonaparte: Bonapartismo Policial.

Esta soberba ditatorial, ainda que nem tivesse a duração de 24 horas inteiras[3], revela que o abuso constitucional e a violação de direitos fundamentais é uma crônica que veio para perdurar. Este é apenas um dos traços do fascismo que nos coloniza atualmente no Brasil: inviabiliza-se sistematicamente a Soberania Popular.

O processo de colonização fascista, outrossim, teve vigência (i)legal decretada com o impedimento de 2016. Estabeleceram o regime político-jurídico que nos governa: Ditadura Inconstitucional. Manipulando-se os preceitos do Estado de Direito contra a filosofia constitucional democrática estampada no Preâmbulo da CF/88.

Em 2017, como passo além do que se vislumbra desde o impeachment – e salvo insignificantes exceções –, os três poderes desvestem-se atuantes contra a República. Com poucas divergências entre si, mais animadas pela vaidade pessoal do que pela liturgia dos cargos, a autocracia massacra a “independência dos poderes”. Com a “divisão dos poderes” esfacelada por ação institucional direta, o Poder Público é um monólito. No Cesarismo de Estado está claro somente o mantra de que se deve “dar a César, o que é de César”.  Agindo como se fora “um-só”, todo o poder tende a César – que não faz rodeios para usar/abusar dos meios de exceção.

Ao prevalecer a regra farisaica de que “os fins justificam os meios”, a Democracia é atropelada todo dia. O Estado de Exceção, protocolado em 2017, chega ao ridículo inconstitucional (fascismo) de obrigar jornalistas a revelarem suas fontes, sob pena de prisão, ou divulga gravações de jornalistas (com supostas fontes) sem nenhum vínculo processual.

Sob este prisma, o mote de que precisamos de outro Processo Constituinte faz sentido, pois a Constituição de 1988 já não vigora mais. Realmente, o que estava por base na Carta Política – fazer-se politicamente no espaço público, cultivando-se a civilidade e urbanidade, como ser que se torna humano por meio da Política –, antes e após a GLO, é algo pretérito.

           

                        Vinício Carrilho Martinez (Dr.)

Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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