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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

Só a esquerda combate a corrupção



No Estado de Exceção prevalece a mentira e o engodo, notadamente, no campo político. Embaralham-se as figuras e as posturas políticas para que aquilo que é uma anormalidade política (e óbvia manipulação ideológica) se torne aparente e consagradora.

A relação no espectro político-partidário (ou societal, se observarmos a postura das diferentes agremiações sociais, culturais e ideológicas no amplo contexto nacional) não é diferente.Só a esquerda combate a corrupção - Gente de Opinião

Assim, ainda se fala de direita e esquerda no tocante à conquista e defesa de direitos e no manejo da coisa pública. Historicamente e por força de seus interesses, a direita sempre esteve associada à defesa do capital, bem como a esquerda sempre se legitimou na luta pela mudança do status quo.

Contudo, se não mais se acredita nessa postura clássica, pode-se/deve-se tomar o combate à corrupção público-privada como um divisor de águas ou diferencial lógico e ideológico entre direita e esquerda, no Brasil de 2015.

No Brasil atual, por exemplo, quem se bate efetivamente contra a corrupção que se generalizou dentro e fora do Estado? Quem sempre se beneficiou do Estado, estivesse ele corrompido ou não?

Daí se perguntar: o combate à corrupção é exclusivo da direita? É o que se perguntam revisionistas de última hora e bem inclinados ao fascismo. A resposta é NÃO. Até porque, pela lógica mais simples e sublime (exatamente por ser simples), quem detém o capital capaz de comprar e de corromper é a direita (às vezes mais, às vezes menos fascista – às vezes mais, às vezes menos corrupta).

Não existe, por definição (epistemologia), pelo senso mínimo da verificação histórica (ontologia) e pela lógica da relação de forças uma esquerda capaz de empurrar os interesses populares para dentro da garganta do capital hegemônico. Que apresentem um único episódio da história política em que a esquerda adotou critérios fascistas e praticou a corrupção da coisa pública.

Se pensarmos que a corrupção da Petrobrás (e outras) é mostra de que a esquerda se corrompe, é porque não sabemos o que é estar à esquerda de fato. O fato de que alguns agem assim, corrompendo-se, mutilando a República, apenas comprova que nunca foram de esquerda alguma. Talvez nem saibam qual a origem da dicotomia esquerda x direita.

Na véspera da Tomada da Bastilha – no curso da Revolução Francesa –, no Parlamento, à esquerda se sentavam os representantes do povo e, à direita, os nobres (com cadeiras cativas). E, mesmo assim, este fato não asseguraria muita coisa. Cícero, o maior senador da República Romana, era nobre, mas seu lema era: “Não preciso me comportar como um do povo, basta que seja para o povo”. Isso é esquerda.

Pode-se ter o pé rachado pela roça e os vincos da exploração do chão de fábrica, como muitos líderes operários, ou pode-se praticar a famosa “traição de classe”: quando se nasce num determinado meio social, mas se sabe que a Justiça exige uma guinada ideológica na vida, nos pensamentos e nas ações. É o que indicava Cícero.

Cícero era nobre, honrado, republicano e – nos parâmetros atuais – de ação esquerdista. Um radical que não fazia mediações com o Mal público, com a tergiversação do interesse coletivo. Fora disso, é balela – da direita que quer disfarçar seus golpes ou da suposta “esquerda” que põe pelagem de ovelha nos piores lobos de galinheiro. Fora disso, só há corrupção do próprio significado do que é a “coisa pública”.

E lembrando-se sempre que, historicamente – por detenção do capital capaz de comprar a alma humana –, a direita é quem pode comprar e forçar toda e qualquer venda. O trabalhador não vende a força de trabalho, simplesmente porque não tem poder. É só o empregador quem compra; o trabalhador aceita as condições ou não. Quem é ou foi trabalhador com carteira assinada (ou implorando por seu registro) sabe disso. Negocia quem tem poder.

Do mesmo modo que se compra o voto do eleitor e do congressista (de direita) corrupto, compra-se a passividade do trabalhador em troca da sobrevivência no emprego. Nem todos de direita são corruptos, mas é uma tendência capitalista natural querer se arvorar do Estado, como máquina de força política para alavancar seus negócios. O pobre não pode corromper ninguém. Chega a ser infantil pensar o contrário.

Quem diz que o povo está condenando à corrupção (além da direita manifesta em atos públicos) quer desviar o foco das manifestações golpistas – direitistas – que se arvoraram desde as eleições presidências de 2014. Simplesmente porque não apresenta o moto contínuo da corrupção no Brasil. Portanto, só a esquerda combate a corrupção. E se alguém sentado à direita também o faz, é porque pegou a cadeira errada.

Vinício Carrilho Martinez

Professor da Universidade Federal de São Carlos

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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