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O negro brasileiro e a construção da sua identidade



Em pleno século XXI, a impressão que se tem é que o negro no Brasil, ainda está com o pé na senzala.

Essa invisibilidade do afrodescendente brasileiro, têm a ver com a sua trajetória histórica. Desde que o negro trazido da África chegou ao Brasil, por força do processo de escravização, lhe foi negada a condição de exercer a sua cidadania.

Muito embora tenha contribuído de forma espetacular para a formação do nosso povo, o sistema opressivo a que foi submetido, ignorou a sua cultura, tripudiou com a sua liberdade, transformando-o em mero objeto de uso, como uma mercadoria a ser negociada na feira.

Para compreender esse processo é necessário uma maior percepção da trajetória do negro arrancado à força do seu continente, o seu mergulho nos porões das senzalas, escravizado e destituído, das suas condições mais dignas.

Conforme Helenise Conceição e Antônio Carlos Conceição em artigo “A construção da identidade afrodescendente” afirmam:

“Os africanos foram dominados em forma de escravidão e identificados como negros, crioulos ou pretos, sem qualquer respeito a suas diferenças culturais. Desta forma, estabeleceu-se desde o princípio da nossa formação histórica, uma associação entre a posição do indivíduo e a cor da pele. Através de várias gerações, foram identificados e tratados como quase gente, de forma sempre negativa em todos os planos.”

Essa posição é corroborada pela historiadora e etnógrafa pernambucana, Cláudia Lima, em seu artigo “reflexão sobre a história do negro no Brasil, que no dizer dela, “Ao estabelecer diretrizes nos estudos do negro no Brasil, deve-se levar em conta a desinformação sobre a África, sua história e a sua complexidade cultural, que gera sentimentos de desagregação no povo afro-brasileiro e desenvolve um processo de negação na sua origem em função de uma história expropriada do continente africano.”

Essas afirmatias nos remete à condição do negro, desde o Brasil colonial,  passando pelo Brasil império, Brasil República, até os dias atuais.

Foi um caminho marcado pelo sofrimento, pela subserviência, sob a supremacia do domínio da elite branca. Uma postura envergonhada, carregada de preconceitos e discriminações, que condicionou os afrodescendentes a uma situação de “sub-raça”, pessoas de segunda classe.

A crença na supremacia da cultura branca dominante, traz no imaginário do negro brasileiro, a subjetividade da negação da sua identidade, de não se reconhecer como elemento que teve participação ativa na formação do nosso povo.

Conforme enfatizam os professores da Universidade do Maranhão, Ricardo Flanklin Ferreira e Amilton Carlos Camargo no estudo, “As relações cotidianas e a construção da identidade negra”

“Desde a socialização primária, o brasileiro afrodescendente está submetido a ideologias que o compelem a repudiar, diariamente, sua negritude, elegendo um modo branco de ser e viver. Desenvolve, dessa maneira, uma posição submissa de aceitação e incorporação de valores ditados como ideais por uma sociedade branca que, simultaneamente, desqualifica suas qualidades e valores étnicos, milenarmente construídos.”

Reverter esse quadro, implica necessariamente, a reconstrução do espaço que é devido ao negro, reconhecer a sua efetiva inserção na sociedade brasileira, como protagonista da sua construção histórica, quer seja como mão-de-obra, produzindo a riqueza do país, ou na formação da cultura através das suas crenças e religiosidades, da música, dança, da culinária e tantas outras manifestações de artes, cujo artesanato é um exemplo típico e  que vão compor esse complexo multicultural que forma o povo brasileiro.

É uma tarefa difícil, na medida que requer num primeiro plano a aceitação do negro com sua identidade cultural, sem os refúgios simbólicos dos mitos e heróis nacionais de que fala  Claudia Lima, no mesmo artigo citado acima.

Outro aspecto fundamental, é o processo brutal de exclusão a que o negro foi submetido, fruto da desigualdade que aprofundou no tempo, a distância entre brancos e negros.

Temos praticamente a metade da população brasileira formada por afrodescendentes, a sua maioria vivendo muito abaixo da linha da pobreza.

Nessas condições, saltam aos olhos, as duas formas mais cruéis de discriminação, a racial e a social. Essa combinação, determina todo um processo de perversidade com o negro na medida em que o marginaliza, o exclui de uma efetiva participação sócio cultural e impede o seu acesso aos bens e as oportunidades que devem ser proporcionadas aos que detém cidadania.

Nesse contexto, pensar ações que reduzam essas desigualdades e as diferenciações de sociabilidade, é de fundamental importância. Ações que gerem mecanismos  de inclusão social.

No curto é médio prazo a ênfase às políticas afirmativas pode ser o melhor caminho para reparar a grande dívida social que se tem para com o negro.

No longo prazo, é necessário as mudanças estruturais que permitam maior democratização das oportunidades, possibilitando uma maior igualdade socioeconômica ao negro, trazendo o resgate da sua identidade, o seu papel de ator social, tornando-o sujeito da sua própria história. 
 

Edilson Lobo é professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Rondônia - UNIR

[email protected]

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