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Frei Betto

VATICANISTA CONTA ENCONTRO FREI BETTO E O PAPA



Envio o artigo do jornalista-vaticanista da RAI (Rádio e Televisão Italiana) Raffaele Luise, com quem podem entrar em contato (vejam os endereços ao final desta mensagem). O Sr. Luise me deu o encargo de traduzir o seu artigo sobre a "verdadeira conversa" entre Frei Betto e Papa Francisco.

Atenciosamente,
Antonio Vermigli, Jornalista, Itália


Eu tive o prazer e a honra de acompanhar o encontro com o Papa Francisco, depois de Arturo Paoli, também outra importante e nobre figura de teólogo da libertação, o dominicano Frei Betto, vítima das torturas da ditadura militar no Brasil, como ele mesmo documentou no seu livro “Batismo de sangue”. Livro que, com emoção, Frei Betto doou ao Papa, junto com o seu último “Um homem chamado Jesus”, naquela manhã de quarta, 9 de abril, quando eu o acompanhei na escadaria em frente da Basílica, na cerimônia do beija-mão que, ao fim da audiência geral, permitiu-lhe falar com o Papa Francisco por quatro, cinco minutos. E agora, deste colóquio, única testemunha,farei o relato fiel.

Foi um tempo muito rápido, porém suficiente para Frei Betto conseguir dizer ao Papa quatro ou cinco coisas de extrema importância para ele, Frei Betto, e que, nas longas horas da espera (de 9h ao meio-dia) o teólogo dominicano deve ter várias vezes repetido e resumido na sua cabeça, com o intuito de ser o mais eficaz e sintético na hora de conversar. Era evidente o seu intenso recolhimento.

Quando Frei Betto se apresentou ao Papa, Francisco mostrou logo saber quem era o interlocutor na sua frente, e parou para falar com ele alguns minutos, apesar da multidão que estacionava na escadaria. E o relato que, logo depois, Frei Betto fez do colóquio, no microfone meu e da colega de “Rai News 24”, Vania De Luca, e na sucessiva entrevista com o vaticanista do “Corriere della Sera”, Gian Guido Vecchi (que ele relatou numa narração cuidadosa e fiel), correspondeu totalmente ao que o Papa e o teólogo da libertação brasileiro falaram naquele breve tempo.

“Eu o agradeci" - disse textualmente Frei Betto - "pela bela mensagem que o Papa enviou ao Encontro Nacional das Comunidades Eclesiais de Base em janeiro, no Brasil, e falei-lhe que as Comunidades de Base não constituem um movimento na Igreja, mas um modelo de presença da Igreja entre os pobres e dos pobres na Igreja."

Em segundo lugar, solicitei ao Papa, como pai amoroso, para dialogar sempre com a teologia da libertação, que é filha fiel da Igreja e que quer o bem da Igreja. Depois, como dominicano, pedi ao Papa Francisco a reabilitação de Giordano Bruno e de Meister Eckhart, e ele me respondeu: ‘Precisa rezar por isso, necessita rezar por isso’.Enfim, parafraseando a controvertida expressão: ‘extra ecclesiam nulla salus’ (fora da Igreja não há nenhuma salvação), eu disse ao Papa: ‘Santo Padre, extra pauperes nulla salus’ (fora dos pobres nenhuma salvação) e o Papa, sorrindo, disse: ‘Concordo, concordo’.

Mas, antes de prosseguir com as demais perguntas da entrevista, sinto-me obrigado a fazer a um esclarecimento muito importante: apesar do que foi relatado unanimemente por mim, por Vania De Luca e por Gian Guido Vecchi, um jornalista de “La Repubblica”, sem conferir comigo, única testemunha do encontro, e que na ocasião fui também assessor de imprensa de Frei Betto (fui eu quem divulguei a notícia à agência Agi), inventou do nada que Frei Betto foi recebido em Santa Marta, quando a fotografia publicada um dia depois no “Osservatore Romano” mostra claramente que o encontro aconteceu perto da escadaria de São Pedro (coisa escrita também no mesmo “Osservatore Romano”, no artigo que acompanha a foto do encontro).

Além disso, entre outras inexatidões, o artigo mencionado no “La Repubblica” relata que a resposta do Papa ao Frei Betto em relação ao pedido de reabilitação de Giordano Bruno e Meister Eckhart, teria sido: ‘Sim, rezo por isto’ (sic). Uma evidente e irresponsável alteração das palavras do Papa, assim como Francisco tem pronunciado, e como fielmente referiu Frei Betto mesmo, e como - cabe repetir - tem referido quem acompanhou o teólogo latino-americano e também os ótimos colegas de “Rai News 24” e do “Corriere”.

E no mesmo, grave erro caiu quem, confiando e lendo apenas o artigo bagunçado de “La Repubblica”, e sem compará-lo pelo menos com o preciso relato do “Corriere della Sera” e com o “Osservatore Romano”, imputou a Frei Betto o falso artigo de “Repubblica” e as falsas palavras do Papa Francisco. Mas imprudente foi somente o artigo de “Repubblica” e quem o citou sem refletir, evitando exercer o necessário discernimento. Tudo isso desagrada demais porque, desta maneira, acaba-se de jogar de forma irresponsável e gratuita uma sombra sobre o nosso grande Papa, e calunia-se um nobre personagem que é Frei Betto.


Mas, dito isso, prosseguimos na entrevista.

P- Qual é a situação da Teologia da Libertação hoje?
R-
A Teologia da Libertação sempre foi muito viva. Hoje ela não trata de assuntos revolucionários, porém encara os temas do desenvolvimento, das causas da miséria, da ecologia, da proteção do meio ambiente, das novas tecnologias, dos avanços da cosmologia, das nanotecnologias e da bioética, ou seja dos variados assuntos novos que se adicionaram à Teologia da Libertação.


P- Estes são assuntos próximos a Francisco.
R-
Sim, são temas próximos a ele porque o seu primeiro texto, a exortação apostólica “Evangelii Gaudium”, é quase um texto subversivo. Até o “Economist” protestou, dizendo que o Papa entendeu errado, e a estadunidense CBS fez o mesmo, evidenciando que o Papa deve conhecer melhor a realidade do mercado. Mas todos sabemos que o mercado está contra os direitos humanos, porque defende a apropriação privada do capital e da riqueza.


P- Na sua opinião, a Igreja está pronta a seguir o radicalismo evangélico do Papa Francisco?
R-
Não, ainda não. Temos uma cabeça nova mas um corpo velho que não mexe muito, está um pouco paralisado. Precisa de tempo para adequar a cabeça ao corpo e o corpo à cabeça.

 

Raffaele Luise
Roma, 2 de maio de 2014

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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